Diferentemente
do comunismo, um mito capaz de seduzir muita gente com seu sonho igualitarista,
o fundamentalismo religioso islâmico, hoje o principal adversário da
civilização, só pode convencer os já convencidos. (Mario Vargas Llosa)
Religião,
pelo que me lembro, é religação. Religação entre terra e céu, Deus e ser
humano, pão e oração. Mas, que ser humano? Que Deus? E, quando fazemos essas
perguntas, o caldo entorna. A religião se torna prenúncio de guerra. Não há uma
só religião, nem há um ser humano padrão, nem há apenas uma concepção de Deus
e, por isso mesmo, não há uma religião ou “A” religião. Mas há aqueles e
aquelas que consideram a sua religião como “A” religião, onde os sensatos e
fiéis devem congregar para alcançar a vida eterna, ou seja lá o que se passe
pela cabeça deles e delas.
Logo,
os que não seguirem a “minha”, a “nossa” religião, que é a verdadeira, a
original, com selo de qualidade de pureza santa, são os ímpios, os impostores,
os “falsos profetas”. Então, todos os esforços devem ser feitos para limpar a
terra dessas "excrescências diabólicas" que ofendem a nossa concepção do sagrado. Pois é
isso que está fazendo um candidato pastor, Elionai Muralha, do PRTB, conforme reportagem
do A Tarde do dia 6/9/2014. Este candidato quer a retirada das esculturas dos orixás
do Dique do Tororó e imagens de orixás de espaços públicos, em Salvador, Bahia.
Alega que o Estado é laico. Por esse pensamento a estátua do Cristo Redentor,
no Rio de Janeiro, também deveria ser demolida, pois o estado não pode ser
laico apenas para ele e para seu "cristianismo de resultados", eleitoreiros, por
sinal.
Claro,
com um sujeito desses – que eu não sei bem classificar se é fundamentalista louco ou
se é apenas um oportunista eleitoreiro, como é mais comum em nosso país – não dá
para estabelecer diálogo. Mas dá para antecipar-se ao que pode vir a acontecer
num futuro próximo com o fortalecimento de correntes religiosas na sociedade
política, ou seja: nas estruturas de poder do estado. Eu não pertenço a
religiões afro-brasileiras, mas defendo o direito dessas religiões terem
reconhecidos seus símbolos religiosos em espaços públicos. Aqui em Jacobina tem
a “Praça da Bíblia” e o Cruzeiro, este último um dos principais símbolos da
cidade, e nunca vi um evangélico ou católico ser contra a sua criação e
institucionalização. E concordo que seja assim.
Esse
pastor não apresenta e nem deve conhecer a história de nossa gente, que é
principalmente, não apenas a história dos brancos, mas também, sobretudo na Bahia, a história da África e dos
africanos no Brasil e na Bahia, porque desconhece o sofrimento de quem foi
negado em suas crenças, em seus símbolos, em suas construções subjetivas, além
das inúmeras atrocidades que sofreram/sofremos. Fico fazendo um devaneio de
outras possibilidades históricas. Ao invés de termos sidos colonizados por portugueses,
poderíamos ter sidos colonizados por africanos, de algum país a oeste deste
continente. Qual seria a nossa língua? Qual seria o nosso padrão de beleza?
Teríamos um padrão estético? Qual seria a nossa religião? Como seria a nossa
relação com os indígenas? Creio que reuniríamos a família e iríamos aos
terreiros de candomblé ou de umbanda, caso existissem, para exercer nossa fé
comunitária, sem problema algum, pois o diabo não foi Exú nem os africanos quem inventaram: foram
os brancos de outrora. Foi a sociedade branca e racista que associou
ideologicamente o candomblé e a umbanda com o que é demoníaco. Pois eu vejo o
candomblé e a umbanda como expressões de povos, comunidades religiosas, grupos e pessoas, de
suas relações com o SAGRADO, assim como fazem evangélicos e católicos.
Tenho
grande preocupação com esse tema, pois percebo que podemos ter a nossa “guerra
santa” ainda em breve, caso o Estado não coíba iniciativas desse tipo, que
estão ficando cada vez mais ousadas e desrespeitosas, por causa da crescente
bancada evangélica na sociedade política do Brasil. Já temos problemas demais,
como o racismo, a homofobia, a qualidade de nossa saúde, nossa educação, a
condição do nosso sistema presidiário, nossa insegurança pública, a corrupção
institucionalizada, o sistema penal frouxo, entre tantos outros. Tem pastores de tv, aliás milionários com o dinheiro da inocente fé alheia, que se preocupam mais com os homossexuais e com o diabo que terminam se esquecendo do Próprio Deus. A criação do
Partido Popular da Liberdade de Expressão (Pepelê) vem em boa hora nos
representar contra essa sanha populista de candidatos que procuram eleger-se
com propostas estapafúrdias, mas polêmicas, que eles e elas sabem, irá atingir
ideologicamente muitos evangélicos e católicos que converterão seus medos diante de temas considerados apocalípticos em votos fáceis para suas eleições. Esses(as) idiotas metidos
(as) a espertos (as), mal sabem que estão plantando não a semente da paz, do
respeito às diferenças, da compreensão e do amor diante da convivência, mas a semente do ódio, do
racismo e da guerra que virá, se essas sementes germinarem no terreno da
ignorância e do ódio historicamente alimentado por ideologias racistas. Deus passa longe, bem longe, desses pastores da extinção dos (as) outros (as).
VIVA
O PEPELÊ!!! VIVA A LEI 10.639/03! VIVA AS RELIGIÕES AFRO-BRASILEIRAS!!! VIVA DEUS, EM TODA FORMA DE
EXPRESSÃO!
Joselito
da Nair, do Zé, do Rafael, de Ana Lúcia, de Tantas Gentes e de Jesus, O Emanuel.