segunda-feira, 20 de novembro de 2017

DEUS SEM PARTIDO

Quem me apresentou Deus foi minha mãe. Acredito que a maioria de todas as mães da década de 70 do século XX tenham apresentado aos/às seus/suas filhos/as a ideia do divino e do sagrado. Não porque as mães sejam sacerdotisas, mas porque, no contexto cultural de minha infância o machismo não permitia aos nossos homens-pais terem a sensibilidade para falar diretamente de Deus conosco, creio eu. Isso deveria ser “trabalho de mulher.” Eu, sinceramente, não lembro muito do que minha mãe falou de Deus, mas lembro que ela me falou com carinho. Não lembro de quem me falou do diabo pela primeira vez. O diabo nunca fez muito sucesso comigo. Mas o inferno... Ah. O inferno foi “um inferno”! Lembro do inferno e do poder dos diabos de levar as almas dos “desobedientes” para pracolá com um filme que assisti numa igreja Batista. No filme os “cãos” vinham pegar a alma de uns jovens motoqueiros que morreram num acidente, arrastando-os inferno adentro, deixando um rastro horripilante de terror em forma de gritos horrendos. O filme foi um sucesso! Eu e a maioria da plateia “aceitamos Jesus” no finalzinho, antes mesmo das letrinhas subirem tela acima. O garfo do diabo me empurrou para os braços de Jesus. Mas agora fiquei pensando: será que naquele dia, não foi uma combinação entre ambos que o pastor e sua assistência armou pra gente?

Durante minha existência Deus e o diabo foram se fazendo presente. Deus foi adquirindo seus contornos sisudos, com sua barba grande e sua vigilância enorme. Deus é grande! O diabo também foi ficando cada vez maior, à medida que meus hormônios foram me adolescendo. O pecado dos homens que exercem seus podres poderes não era discutido. Somente o nosso, adolescentes com hormônios fervilhando nossa sexualidade potente. Não havia lugar para me esconder de Deus e do seu foucaultiano Olho Panóptico. Mas os espermatozoides pediam movimento! A exigência biológica e a imposição “celestial” brigaram durante muitos anos como um hobbit fugindo do olho vigilante de Sauron. E aquilo me fez sofrer. Eu era um culpado, um cristão menor que não conseguia conter meus próprios instintos. Que perversidade as igrejas fazem conosco! Nesse caso, não há diferença alguma entre deus e o diabo. Eu procurava sombras e esconderijos, mas havia um olho em mim. Um olho que uma cirurgia diabólica inscrita na moral social dominante, colocou dentro de mim. Era me confessando num dia e “pecando” num outro. E o inferno estava logo ali, bem quentinho, com um diabo preparando minha alma para churrasco.

Até aquele momento, não havia elementos históricos ao meu alcance para questionar uma coisa: o paraíso era branco! O candomblé me dava arrepios! Os atabaques me deixavam inquieto. A família falava daquele som como se fosse uma celebração diabólica. E eu acreditava piamente nisso. Por incrível que pareça, e aí lá se vão as contradições da vida, contradições que formam brechas de esperança, o candomblé foi reaparecendo de modo respeitoso em minha subjetividade através de um padre, muito rigoroso eu o achava, mas que revelou-me a experiência de Deus de outro padre com o Candomblé. Falou-me rapidamente dos orixás, dos ritos e da profunda fé do povo de santo, etc, mas o suficiente para que eu entendesse que Deus não tinha partido. Deus era muito maior do que me disseram e do que imaginava. Me falaram de um deus pequeno e mesquinho. Me contaram de um deus que tinha cor e raça: um deus branco europeu, que parecia não ter saído do povo judeu. Esse deus no qual eu acreditava estava mais para um Odin ou Zeus, e Jesus estava mais para Thor ou Hércules, do que para aquele humilde pescador cujo julgamento é suave e cujo fardo é leve.

Esta semana peguei aleatoriamente uma revista dos Testemunhas de Jeová e procurei um negro em suas imagens. Não achei. Não havia, naquela revista daquele número, uma família negra! Deduzi que o céu desses camaradas é branco. Esses deus deles tem partido: é capitalista, branco e macho. O macho, adulto, branco, sempre no comando (Caetano Veloso) tem um deus sob medida para suas crenças políticas, sociológicas, biológicas, histórica, gráficas e geográficas. Um deus republicano! Um deus industrial e urbano, um deus financeiro que empresta (abençoa) somente para os que se filiaram às suas agências. Um deus que tem horror à Débora, a Esther, a Sara, à Simone de Beauvoir e às mulheres fortes e sábias de modo geral. Esse é o deus de Trump, o deus de Silas Malafaia, do Pastor Waldomiro, de deputados pastores, o deus da Veja, da Rede Globo, etc.

Deixei de acreditar nesse deus que me fizeram acreditar a ponta de garfo ardente. Comecei a perceber que Deus era bem maior do que eu pensava, repito. Bem maior. Comecei a rever Jesus na estrada, na favela, na roça, na taba, no Candomblé, na floresta, nas passeatas, na roda de samba, na capoeira, na ciranda, nas tranças que a existência foi fazendo em minha cabeça. Eu deixei de pegar o ônibus pro inferno cristão. Saltei bem antes. E comecei a caminhar com meus próprios pés em direção à Deus. Um Deus de todas as cores, inclusive negro. Um Deus de olhos puxados e cabeça raspada, um Deus de cabelos trançados e cachimbo na boca. Um Deus vestido ora à Ghandi, ora à Nelson Mandela. Um Deus que dança com sua gente e que celebra a humanidade que ele criou e que continua se recriando, surpreendendo-o a cada século; Deus, que só me censura se eu ofender e agredir ao outro, à outra; Deus, que as vezes se finge distraído para que eu não me sinta constrangido com sua onipresença; Deus, que não tem partido, mas sempre toma partido em favor dos excluídos, dos que morrem afogados no meio do deserto oceânico, fugindo das guerras provocadas pelos homens brancos gananciosos que querem beber toda água doce, mas nunca se saciam; Deus, que está ao lado das mulheres, dos/as homossexuais, dos adolescentes e jovens negros assassinados sistematicamente pela indústria da morte que funciona nas favelas suas máquinas assassinas.

Não há consciência humana no Brasil e no mundo se não há uma consciência negra. Negar a consciência negra, apagando-a dentro de uma suposta concepção superior de consciência – geralmente branca – é negar a história humana e ocultar ideologicamente o racismo praticado todos os dias, todos os anos de nossa existência coletiva, “pacificando” a guerra que ocorre todos os dias de nosso tempo histórico . E, negar a história humana, é negar à justiça o seu apelo à verdade, é mentir, é ocultar, é recriar as bases para que um deus com partido, com cor, causador de exclusão, sofrimento e dor retome seu antigo apogeu, criando fiéis cujo racismo não será pecado, mas o aborto causado em função de um estupro, um pecado imperdoável. Eu creio em Deus, mas não mais num deus pequeno, restrito, tacanho e mesquinho. Deus, de fato, é grande, mas não do tamanho do racismo religioso e cristão, nem da cor branca que a sociedade salva antecipadamente no seu paraíso privado. Esse deus, esse deus... É o diabo!


Joselito Manoel de Jesus, O Filho de Deus, O Negão.     

terça-feira, 14 de novembro de 2017

A caminho do inferno

O bom do envelhecimento é ir se tornando humilde, cada vez mais. Além disso, eu estou sentindo que não preciso mais de tanta coisa comigo. Estou deixando cair ao longo do caminho o peso desnecessário, que nunca valeu a pena carregar comigo. De fato, Saint-Exupéry estava certíssimo: “O essencial é invisível aos olhos, só se vê bem com o coração”. Como ver com o coração? Ah. É coisa difícil. É preciso fazer aquele exercício proposto por Gilberto Gil, “se quiser falar com Deus”.

Se eu quiser falar com Deus
Tenho que ficar a sós
Tenho que apagar a luz
Tenho que calar a voz
Tenho que encontrar a paz
Tenho que folgar os nós
Dos sapatos, da gravata
dos desejos, dos receios
tenho que esquecer a data
tenho que perder a conta
Tenho que ter mãos vazias
Ter a alma e o corpo nus
Se eu quiser falar com Deus
Tenho que aceitar a dor
tenho que comer o pão
que o diabo amassou
Tenho que virar um cão
Tenho que lamber o chão
dos palácios, dos castelos
suntuosos do meu sonho
Tenho que me ver tristonho
Tenho que me achar medonho
E apesar de um mal tamanho
Alegrar meu coração
Assim, fazendo esse exercício espiritual, podemos abrir um olho em nosso coração, porque o próprio coração já estará aberto para ver pela primeira vez o que sempre foi visto com olhos marcados pela ignorância, pela maldade pela vontade de submeter o outro, a outra, aos nossos caprichos. 

Por isso temos que nos achar medonhos. Quem se acha medonho? Poucas pessoas. Porque a feiúra, o pecado, a mesquinhez, a violência, a agressão a fofoca, é sempre o outro, a outra, que fazem e cometem. E a gente é belo, não é mesmo? Nós somos “os escolhidos”. Somos nós que merecemos o paraíso e não “o pão que o diabo amassou”. Ora, se não aceitarmos a dor de que somos iguais, ou até piores, que os outros e as outras, e que também contribuímos com a degradação do mundo, jamais poderemos ver com o coração, muito menos falar com Deus. Como é que Deus vai ouvir algo que não é sincero? Se não temos “as mãos vazias, a alma e o corpo nus”?  

É muito difícil esse exercício de aproximação com Deus. “Aceitar Jesus”, como dizem uns por 
aí e por acolá, é a coisa mais fácil que existe. Cruzamos uma linha imaginária, depois de um ritual simples de passagem, entre "o mundo" e o Reino de Deus; entre o mal e o bem, entre a “carne” e o espírito; entre o injusto e o justo e, a partir daí, começamos a apontar o dedo para os outros, os do lado de lá daquela fronteira que foi criada para excluir. Pegam suas pedras nas mãos e se preparam para atirar nos “pecadores”, naqueles e naquelas que andam no pecado, no “mundo”. E se, por alguma esperteza, no seio da história humana, alguém desenhou essa fronteira pra lá do seu pecado? E se essa cartografia espiritual começou errada, desde o princípio e, de repente, a gente descobre que Deus anda mais do lado de lá que do lado de cá? De que Deus não está nem aí para qual agremiação eu pertenço como gado, nessa vida imbecil de seguir pastores que me pedem dinheiro para provar minha fé? De que Deus quer ver “minhas mãos vazias, minha alma e meu corpo nus”. E "apesar de um mal tamanho, alegrar meu coração", porque o encontro com Deus se dá quando abrimos mão de nossas vaidades, de nossa necessidade de controlar a nós, os outros, as outras, o destino e tudo o mais, para encontrarmos a felicidade face a face, na alegria do coração, que nos desarma e nos acalma na profunda realização de nossa existência.  

Aí o MBL iria atirar suas imprecações contra o próprio Deus. Porque a nudez é tabu. A nudez será castigada. Porque alguns seres humanos querem ser “anjos” e não conseguem ser o que são, porque seus olhos estão cerrados pela ignorância e pela arrogância. Eu queria estar no momento dessas pessoas encontrarem com Deus, se conseguirem. Ia ser uma decepção! Então seguiriam alegremente o diabo, com uma arma na mão, uma bíblia na outra, cantando as glórias da racionalidade que o diabo pregaria, rumo ao inferno, que, como diria Sartre, é sempre o outro”.


Joselito Manoel de Jesus, Professor, Poeta e Corredor de Rua.    

sábado, 14 de outubro de 2017

SUJEITO-POLÍCIA x SUJEITO-BANDIDO: GUERRA DE UM PARADIGMA FALIDO

No final do século, encontramos-nos perante a desordem tanto da regulação social como da emancipação social. O nosso lugar é em sociedades que são simultaneamente autoritárias e libertárias. (Boaventura de Sousa Santos)

O autor acima citado, discutindo a transição paradigmática, elege duas dimensões privilegiadas para assim o fazer: a dimensão epistemológica e a dimensão societal. Segundo ele
A transição epistemológica ocorre entre o paradigma dominante de ciência moderna e o paradigma emergente que designo por paradigma de um conhecimento prudente para uma vida decente. A transição societal menos visível ocorre do paradigma dominante – sociedade patriarcal; produção capitalista; consumismo individualista e mercadorizado; identidades-fortaleza; democracia autoritária; desenvolvimento global desigual e excludente – para um paradigma ou conjunto de paradigmas de que por enquanto não conhecemos senão as “vibrations ascendentes” de que falava Fourier (SANTOS, 2001, p.16)
Essa transição, com suas dimensões, estão ocorrendo neste momento, gerando um desafio enorme em nossa capacidade de entendimento. Alguns recorrem, com o avanço do evangelismo de resultados, a explicações do fim do mundo na base do maktub, e assim se resignam ao “inevitável” armagedom, apontado os dedos para os pecadores que, segundo eles e elas, perecerão por não aceitar o deus deles/as. Outros fingem não ver o que acontece a sua volta, mesmo porque não entendem e, desse modo, se acomodam em viver nesse “caos” como se não houvesse amanhã. Alguns, porém, recorrem à reflexão sistematizada porque desconfiam que as partes só podem ser apreendidas coerentemente por um todo complexo que lhe dê explicação em seu conjunto de ocorrências, aparentemente sem nexos.
Há uma mudança de paradigmas que está provocando no mundo reações que geram inúmeros acontecimentos que exigem decifração sob pena de sermos devorados pelo sem-sentido que pode nos levar à loucura coletiva. As mudanças começaram antes da segunda guerra mundial e agora estão se acelerando, o que dificulta nossa forma de entender, exigindo outro entendimento para além da luta do “bem contra o mal” que alguns idiotas querem nos impor como discurso “verdadeiro e justificável”. Ou superamos esse maniqueísmo fácil e tolo, ou sucumbiremos em guerras que nos estraçalharão eternamente num inferno terreno. Somos bons e maus e, assim sendo, como posso combater o mau alheio se preciso travar uma grande batalha dentro de mim mesmo? Como eliminar meu/minha inimigo/a se ele/a apresenta dimensões de bondade que me faltam? Quais foram os critérios de escolha dos/as meus/minhas inimigos/as? Quem me ensinou a identificar e a odiar aquele que eu penso que escolhi para inimigo?
Saiu recentemente um estudo do Fundo das Nações Unidas da Infância (Unicef) que mostra que o Brasil bate recorde na morte de adolescentes e jovens negros, principalmente no Nordeste, tendo Fortaleza e a minha cidade de Salvador como as primeiras colocadas nesse holocausto sinistro. Segundo o repórter responsável pela matéria
Os dados mais recentes, de 2014, divulgados ontem [11/10/2017], mostram que o Índice de Homicídios na Adolescência (IHA) brasileiro alcançou a marca de 3,65 pessoas entre 12 e 18 anos assassinadas para cada grupo de mil jovens.
A pesquisa analisou os homicídios de jovens nos 300 municípios com mais de cem mil habitantes e se baseia nos dados do Sistema de Informação sobre Mortalidade do Ministério da Saúde. (ANTÔNIO JÚNIOR, 2017, p.B5)
E muitos de nós somos levados a pensar, na base ideológica do “bandido bom é bandido morto”, que se eles morreram é porque mereciam, na medida em que é muito difícil morrer um “inocente” nessa guerra urbana, na qual o tráfico se torna o maior responsável, como se o tráfico de drogas fosse uma entidade maligna que explica por si só, a tragédia anunciada e proclamada.
E então se reforçam as condições ideológicas para o fortalecimento do sujeito-polícia como o herói que vai restituir a ordem perdida ou, quando muito, nos proteger da desordem da orda barbaria que invade nosso "território de segurança e bem-estar", o que o mesmo Santos denominou de "zonas civilizadas", em contraposição às "zonas bárbaras". Quando eu era menino ouvia discursos pronunciarem uma frase que me deixava esperançoso: “- polícia é polícia, bandido é bandido. Os dois não se misturam". As linhas de fronteira estavam bem delineadas. A polícia era a ordem e o bandido a desordem. E quando eu me refiro à polícia incluo todas as forças armadas. Mas o sujeito-polícia e o sujeito-ladrão com o tempo foram interpenetrando as fronteiras proibidas, e os bárbaros, desde aquele momento, já estavam invadindo nosso “sagrado” território moral, portando a farda como se da ordem fossem. Já não se contrapõem tanto assim nessa ordem em frangalhos, falida, apodrecida, sobre a qual tentamos nos agarrar. Já se confundem entre tiros e fugas, entre planos e assaltos, entre pontos de drogas e munições. Os filmes de José Padilha, Tropa de Elite e Tropa de Elite, o inimigo agora é outro, retrata isso.
E o estado-regulador entrou em colapso. Não consegue mais responder à “novidade que veio dar à praia” (Gilberto Gil). Os arrastões, feitos por adolescentes, em sua maioria negros, são assustadores sim, mas expressam o grito da barbárie - não dos novos “bárbaros” – esses sujeitos gerados pelas ausências criminosas de um estado burguês que estraçalha tanto o policial pobre que recebe uma merreca para combater o pobre revoltado, e o pobre revoltado que assume a violência e o crime como caminhos únicos desse labirinto mortal no qual, como ratos em um experimento maquiavélico, fazemos atrás da comida e da sobrevivência. Nesse sentido, o sujeito-polícia e o sujeito-ladrão-traficante, fazem parte da mesma desordem, a desordem burguesa e, no caso do Brasil, criminosamente racista.
O sujeito-polícia, deixou de ser o herói, mesmo porque, para grande parte da população, ele não representa mais a ordem, mas compõe a mesma desordem que aflige uma cidadania de papel (Dimenstein), com sua suposta autoridade agressiva e violenta, tentando obter respeito com a arma na mira da cidadania questionadora de seus métodos de capitão-do-mato. Ao lado do sujeito-ladrão, o sujeito-polícia atua, com balas perdidas oferecidas aos cidadãos. Essa "ordem" foi engolida pela desordem burguesa deste momento histórico e não vai ser esta que nos proporcionará esperança. Não vai ser essa democracia autoritária, nem esse neopatriarcalismo na forma humana de um Bolsonaro posando de herói nacional, com sua violência à ponta da arma, que vai nos dar esperança. A nova ordem precisa ser gestada num novo paradigma. Quem sabe não seja um paradigma prudente, desarmado, no qual nossos/as adolescentes tenham escola pública de qualidade, saúde pública, lazer e arte, que caracterizam uma vida decente e dissolvem os sujeitos-morimbundos de uma dimensão societal que insiste em voltar no tempo. Brasil Nunca Mais!

Joselito Manoel de Jesus, Professor, Poeta e insone
Com o auxílio de

JÚNIOR, Marco Antônio. Brasil bate recorde na morte de jovens negros. A Tarde, quinta-feira, 12/10/2017. Salvador, Bahia.

SANTOS, Boaventura de Sousa. A crítica da razão indolente: contra o desperdício da experiência. Vol.1 3. ed. São Paulo: Cortez, 2001.      

domingo, 24 de setembro de 2017

O DES-CONFORTO DE dEUS NA TEOLOGIA DO “ME-DAR-BEM”

Nesse país tão cristão, há tantos cristãos que, desconfio que, se o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) fizer uma séria “recontagem de votos”, teremos mais cristãos que seres humanos. Com tantos jovens negros assassinados nas periferias de Salvador, Bahia, deve haver mais soldados que cristãos, muito embora isso seja paradoxal do ponto de vista do racional IBGE. Porque um soldado não pode ser cristão, já que ele é o braço armado do estado. E na cidade mais negra do Brasil, os números também devem mentir, porque devem ser soldados brancos, orgulhosos de sua raça, limpando Salvador de sua juventude negra. Ou, então, podemos inferir que um soldado não tem cor, não tem religião, nem tem fé. Quando aquele ser coloca a farda, ele se torna um agente do estado e, como tal, sua humanidade se submete às ordens de um poder inquestionável, um poder controlado, não pelos brancos (não é isso?), mas pelo estado incolor, inodoro e, principalmente, insípido que o caracteriza. E o estado, convenhamos, não tem nada a ver com a misericórdia e a piedade divina. E o estado, por ser “incolor”, prende, arrebenta e mata apenas marginais, sujeitos que roubam o povo, todos negros e pobres, como cantava Gil e Caetano. Embora me pareça muito estranho o braço armado do estado não arrebentar nem prender, muito menos matar, e o braço jurídico do estado não manter presos os brancos congressistas que roubam o povo de todo o território nacional.
Que deus é esse? Que lei é esta? Que fé conveniente é esta que se apresenta como uma propaganda comercial, como qualquer outra. Com a teologia da prosperidade inventaram um deus conveniente para cada um. Há um deus que traz meu marido ou minha mulher de volta; há outro deus que me faz ter sucesso no trabalho; existe um deus que faz meu/minha filho/a deixar o vício das drogas e há um deus emergente que cura milagrosamente meu/minha filho/a do homossexualismo, o deus-cura-gay. A fé virou moeda de troca: se eu fizer isso, deus me dará aquilo; se eu rezar três a quatro vezes ao dia aumento a minha possibilidade de obter melhorias divinas na minha situação financeira, que foi o meu pecado, e não o injusto, desigual e cruel sistema econômico e político desse mundo que me jogou nessa condição.
A partir daí vamos criando definições como “abençoado”, que seria aquele/a que está em melhores condições financeiras, políticas e econômicas. Nesse caso, deus está diretamente proporcional à minha posição no mercado. Se tenho um carro, foi deus quem me deu. Quem não tem carro certamente foi o diabo quem providenciou o transporte coletivo. Se tenho uma casa para morar, foi deus quem me deu. Quem mora embaixo da ponte ou nos alugueis da cidade, foi deus quem vetou, por que quem mora de aluguel é mais pecador do que eu. Diziam que a fé não tinha como ser medida. Agora, com a teologia da prosperidade, tem. A medida da fé pode ser em dólar, em real, em euro, em posses que expressam o quanto de fé eu tenho. Pensando no carro ano 2012 que restam 18 parcelas ainda a pagar e nas tantas outras coisas cujo dono é o banco do Brasil e o bando do Brasil, minha fé deve ser bem pequena, quase um ateu. Nada de poupança, dois empréstimos... Huuum. Minha situação tá mal com esse deus emergente das lucrativas igrejas da fé de resultados financeiros. Num país de uma cristandade tão forte, devo ser um herege. Dá até pra medir minha distância desse deus: uns dois a três milhões... de dólares. Porque real não é moeda pra se medir nada com respeito, quando mais tendo um presidente como Temer.  
Creio que muitos “cristãos” devem se imaginar um “Noé”, ou um “Moisés”, os novos super-heróis das novelas, filmes e seriados na base do eu, o bem, o belo e o bom, contra todos os maus. Haverá algum filme de algum santo negro? E quem seriam esses "maus"? Esse é o grande problema desta falsa dialética: os maus são os negros que professam a umbanda e o candomblé; os homossexuais e travestis que contrariam nossas medidas exatas do corpo e do seu gozo; os/as ativistas políticos que reclamam desse suposto estado sem cor e sem raça, sem sexo e sem graça, que torna a nossa vida uma desgraça. Os maus seriam as pessoas que não acreditam em Deus, principalmente nesse deus de resultados imediatos inventado para atender a cada cliente, conforme suas necessidades específicas – desemprego? Separação? Problemas familiares? Problemas de ereção? Temos um deus para o seu caso! Ligue já! Assista nossa programação e venha à nossa igreja, a única que tem um pastor/padre especializado em seu problema e que tem ligação direta com as repartições celestes. Os maus também são os pequenos traficantes, jovens negros que, ali no bairro, matam e morrem a sua esperança numa vida melhor. Os consumidores brancos são "vítimas" do tráfico e merecem o apoio e a misericórdia divina.

É tão fácil usufruir desse deus! É tão prático “aceitar Jesus”! Um deus que vai me dar tudo que eu quero. É tão difícil reconhecer e abandonar a hipocrisia! É tão fácil apontar abençoados e amaldiçoados aqui e ali, é tão difícil identificar que somos preguiçosos e covardes em reconhecer que nosso cristianismo é falso e superficial! Num Brasil com tantos cristãos, não deveria haver mais tantos assassinatos; num Brasil com tantos cristãos não deveria haver tanto feminicídio; num país com tantos cristãos não deveria ocorrer tanta especulação financeira. Num Brasil com tantos cristãos não deveria haver mais pedofilia, como no caso do assassinato de Lucas Terras entre tantos outros e outras. Num país com tantos cristãos não deveria haver tanta corrupção; num território assim “abençoado” é muito estranho essas coisas ocorrerem. E assim, esse nosso cristianismo de resultados do terceiro milênio vai nos salvando da pobreza, da doença, da violência, da morte, da separação, porque deus financia o homem justo com automóveis, apartamentos com piscinas, contas milionárias, harmonia na família e sucesso no trabalho e, com isso tudo, não tem "abençoado" que reclame, muito embora, segundo o IBGE, o número de “abençoados” cristãos venha caindo assustadoramente com a nova política econômica do estado incolor, inodoro e insípido politicamente. Essa política econômica deve ser coisa do "diabo".

Joselito Manoel de Jesus, Sem religião alguma. 

segunda-feira, 18 de setembro de 2017

ELEIÇÕES 2018 NA BAHIA: as esquerdas precisam ressurgir!

O Partido dos Trabalhadores cresceu à luz de setores organizados da sociedade civil como sindicatos, alas progressistas da igreja católica, grupos organizados das universidades públicas, parte da sociedade que se apresentava através de associações de bairro, movimento negro, blocos afros, entre outros que foram saindo da ditadura cruel – que Zezé de "Amargo" afirma em sua tolice oportunista ter sido um "militarismo vigiado" – e começaram a esboçar um poder que estava silenciado no fundo dos calabouços onde as torturas transformavam esperança de igualdade social e dignidade humana em gritos de desespero e de dor. Zezé de "Amargo", em sua "sapiência" de ocasião, deve confundir pau de selfie com pau de arara. Ele não teve unhas arrancadas lentamente, não foi estuprado por milicos psicopatas, nem tomou choques elétricos na genitália. O cantor não deve ter tido parentes que desapareceram para sempre, sem que a família tivesse ao menos o corpo para se despedir. Deve pensar que as pessoas que foram assassinadas pelo regime militar devem ter sido marginais que mereceram ser torturadas, pois “bandido bom é bandido morto”, não é filho de Francisco? Na verdade, os filhos e as filhas das famílias que apoiavam o regime militar são esses/as que usam o patrimônio público como se fora privado, propriedade particular de sua família e de seus/suas amigos/as e apoiadores/as. Desse ponto de vista, foi o “militarismo vigiado” do Senhor José de Amargo que preservou a corrupção, matando as pessoas que queriam um país melhor e protegendo as pessoas que aí estão nos roubando o presente e o futuro, além do passado, em propostas como escola-sem-partido. Os/as paneleiros não estão interessados em combater corrupção alguma. O que eles queriam é que a empregada voltasse a ser escrava, que o encanador voltasse a andar de ônibus, que o pedreiro voltasse a pedir um salário de fome e todos/as voltassem a pedir de joelhos a concessão da classe média e das elites à sua existência precária. 
Mas, voltando ao Partido dos Trabalhadores (PT), penso que, muito embora tenha sido, para a maioria do povo brasileiro, a melhor experiência de governo até agora em nossa história, o partido foi envelhecendo e não procurou formas de renovação fora dos seus quadros de poder, no qual medalhões começaram a luta pela disputa da eleição nas majoritárias, não permitindo a renovação necessária para oxigenação do partido e de sua inserção maior na sociedade, conforme governava o país. Os mesmos de sempre lançavam suas candidaturas, pleito após pleito eleitoral, e, de certa forma, principalmente aqui na Bahia, foram se fortalecendo com a decadência do PFL – hoje DEM (ônio) – com a morte do Capo di tutti capi Antônio Carlos Magalhães (ACM) e a desarticulação do carlismo. A juventude do partido não apareceu, nem deu as caras, como se as correntes do partido tivessem os seus donos que não abriam mão de suas posições conquistadas àquela altura e, dessas posições, buscavam melhores lugares ao sol nos quadros da hierarquia da instituição partidária.
Por outro lado, ao chegar ao poder do estado, o PT não conseguiu sair do ciclo da corrupção alimentado pela cultura política arraigada em nosso sistema de poder. Fomos admitindo que, para governar, é preciso corromper. É preciso fazer pagamentos extras a deputados, senadores, prefeitos, e governadores. Admitimos que, para governar, é preciso oferecer ministérios a partidos para serem usados como formas de roubar os cidadãos e as cidadãs brasileiros/as. Então alguns dizem que o PT não é culpado. Pois sem corrupção não há solução. De fato, não foi o PT que inventou a corrupção, nem o partido que mais roubou, a ARENA/PFL/DEM está aí como prova. O PMDB, o PODEMOS, o AVANTE, o PSDB estão aí nos oferecendo elementos suficientes para vermos que esses partidos utilizam o estado como extensão de suas casas. Mas o PT não conseguiu romper essa cultura secular que nos mantém aos pés do processo civilizatório nacional. Muito pelo contrário, se aproveitou dela e aliou-se politicamente ao que é mais antigo nesse país. Povo que consome mas que não pensa, não é povo. É massa eleitoral! E o que aconteceu?
A igreja católica desarticulou as Comunidades Eclesiais de Base (CEB’s) e os movimentos de esquerda em seu interior, tais como a Pastoral da Juventude do Meio Popular (PJMP) e outras pastorais que formavam uma boa base de pensamento crítico para as populações mais pobres do país – por isso saí da igreja. Aqueles encontros de jovens da periferia, assessorados por pessoas do calibre de Wiliam e de ValdirMarina, foram sendo extintos. O próprio PT, quando começou a ser questionado pelos sindicatos e movimentos sociais, cooptou boa parte das lideranças políticas e as colocou em cargos no estado, onde suas ações foram se tornando inócuas. De todo modo o partido também se deu conta da insuficiência de quadros preparados para assumir o estado e teve de deixar antigo quadro de pessoal que preservava uma velha forma de exercer o poder. Os movimentos sociais foram enfraquecendo e o movimento negro desapareceu da cena pública, pelo menos como era quando o Ylê Ayê, o Olodum, entre outros blocos e afoxés traziam esperança com a negritude de Salvador que reclamava por “força e pudor”. E lá ia eu, ela, ele, todos nós naquele “arrastão” nordestino pelas ruas da cidade onde todo mundo é d’Óxun, mas nem todos/as são assim tratados/as.
E o PT foi perdendo fôlego. Para usar uma expressão de Game of Thrones, não conseguiu “quebrar a roda” que alimenta esse falido e corrupto sistema político e foi se parecendo, cada vez mais, com os partidos contra os quais antes tensionava sua existência. Foi perdendo membros importantes, que foram formando outros partidos, pois nele não mais encontravam canais de expressão ideológica, e, com a ascensão do neoconservadorismo brasileiro – na forma de Bolsonaro, Alexandre Frota, Zezé de Camargo, entre outros/as – o partido se viu enfraquecido, pois não tem mais discurso, nem para um lado, nem para o outro. Não tensiona mais, não representa o sujeito trabalhador fortalecido nas centrais sindicais, que estão sucateadas diante dos rumos que nossa história toma. Não tem mais trabalhador para representar. Aquele sujeito político surgido no fim da ditadura no ABC paulista, não existe mais. O capitalismo achou uma forma de enfraquecê-lo. E sem os jovens das periferias organizados em torno das pastorais de juventude do meio popular; e sem a negritude de Salvador; e sem as classes populares reunidas em movimentos, grupos e instituições que alimentam a esperança de um Brasil melhor para todos/as; aonde o PT vai encontrar força para eleger seus candidatos em 2018?
No discurso da eficiência capitalista na gestão do estado. Pelo menos é este discurso no qual Rui Costa (Rui Correria) está se apegando, não para se contrapor a ACM, o Neto (como bem lembrava Hilton 50), mas para sobrepujá-lo perante os olhos da massa disforme que é a população baiana em sua abordagem mais ampla. E, de fato, Rui é correria mesmo! Foi com ele que o metrô andou a passos largos, mesmo com toda suposta crise econômica vivida neste momento. É com ele que a agricultura familiar é tratada com respeito e dignidade, contrapondo-se ao famigerado agronegócio, entre outras. E tomara que seja suficiente, para não cairmos nas garras dos Magalhães. Votarei em Rui Costa, sim. Contudo, é preciso mais que isso. O posicionamento ideológico das esquerdas não pode ser devorado pela fome insaciável da ideologia instrumental do capitalismo de estado, que reduz a subjetividade ao desejo de poder ter seu trabalho explorado por um patrão empreendedor. E por isso votarei no PSOL para deputados e senadores. É preciso repensar a relação do partido com os homossexuais, com a negritude, com as mulheres, com a juventude, com a população que ficou órfã de espaços para discutir e fortalecer os movimentos políticos, sociais e culturais que fazem surgir e fortalecem novos sujeitos que tensionam com esse bolsonarismo ultraconservador e esse doreanismo de resultados que São Paulo quer que o Brasil inteiro engula, como remédio amargo somente para a pobreza que ascendeu economicamente e socialmente nos últimos anos. As esquerdas precisam ressurgir!


Joselito Manoel de Jesus, Professor

terça-feira, 5 de setembro de 2017

TRUMP-WORLD

Quem sabe não haverá futuro?
Talvez não haja mais futuro no futuro.
Não há mais futuro no presente.
Nunca houve futuro em passado algum.

Não existe possibilidade de,
lá adiante, haver alguma possibilidade.
Acabou o sonho, já faz tempo
Não há mais nenhuma vontade.

Quem viver não verá.
Quem não vive não será
não haverá choro
ninguém mais nascerá!

Nem Jesus vai mais voltar
pra nos salvar de nossa destruição
haverá fogo contra fogo
acabou-se a redenção.
    
Queimaremos todas as florestas
aspiraremos suas fumaças
sufocaremos nossas esperanças
mataremos nossas mulheres e nossas crianças.

Poluiremos nossos rios,
e findaremos nossas alvoradas.
Explodiremos nossas cidades
com nossas atômicas possibilidades.

Acabaremos definitivamente radiativos
e celebramos nosso imenso poder letal
comemorando nosso domínio planetário
sob a orientação do mal.    


Joselito Manoel de Jesus

sábado, 19 de agosto de 2017

TRANSBORDAMENTO

Hoje, enquanto enchia a vasilha de água com limão me descuidei e a água terminou transbordando e caindo armário adentro (Ana vai retar – mas já enxuguei). Ai já estava preparado para dar o meu sonoro e repetitivo palavrão, aprendido durante anos de escuta. Mas eis que outro sentimento me atravessou naquele instante. Veio uma memória de longe que muito me marcou (eu ainda era uma criança). Um discípulo estava com seu mestre, um monge tibetano, e os dois estavam ali em silêncio, sobre aquelas majestosas montanhas. O mestre se ofereceu para servir o discípulo (que lindo) e começou a despejar chá na xícara deste último. Mas o mestre foi despejando chá, enquanto a xícara encheu e transbordou, e seu líquido foi se derramando pela mesa até cair e escorrer pelo chão.

O discípulo, percebendo o acontecimento, alertou constrangido ao mestre sobre sua desatenção. Mas o monge, com aquela serenidade intocável, barrou aquela energia precipitada do discípulo. Com seu olhar calmo, descansou o bule sobre a mesa e disse-lhe algo como para que não se desesperasse com o transbordamento do chá na xícara. Que a aparente distração dele significaria a abundância que ocorre em nossa vida.

Eu nunca esqueci esta cena! E, novamente, ela veio de volta num momento em que estava pronto para soltar mais uma imprecação por uma bobagem, que pode significar o transbordamento da vida. Não da minha, pois a minha vida já transborda. Mas também a vida de todos e de todas! E então, pensei num poema humilde para expressar isso. Expressar. Expressar. Eu preciso expressar!

Que a minha vida transborde
Que da minha existência escorra a seiva da vida,
Para que do meu amor haja mais amor
Para que da minha esperança haja muito mais esperança
Para que da minha compaixão, haja muito mais compaixão
Para que da minha tolice haja mais sabedoria
Para que da minha inteligência haja mais inteligência
Para que da minha sensibilidade haja mais sensibilidade
Para que da minha dor haja mais alegria
Para que da minha escrita haja no mundo mais poesia.

E nada mais de palavrão por bobagem.


Joselito da Nair, do Zé, do Rafael, da Ana Lúcia, de Tantas Gentes, do Monge Tibetano e de Jesus, O Emanuel (O Conosco que fala todas as línguas, inclusive a cinematográfica). 

quinta-feira, 17 de agosto de 2017

O VOTO: VÍRUS OU VACINA?

Próximo ano haverá novas eleições no Brasil para senador, deputado federal, deputado estadual, governador e presidente da república. Será um ano de importante escolha, mais importante e crucial que as eleições passadas, pois será uma “eleição divisora de águas”, na qual veremos se nosso povo quer a continuidade deste cenário ou o início da longa ruptura com ele. Saberemos se queremos a continuidade da corrupção, dos conchavos, das compras de deputados/as e senadores, da entrega do nosso patrimônio nacional ao capital financeiro, do cinismo e da destruição das proteções trabalhistas que afetam a maioria da população brasileira. O voto terá uma valor inestimável neste cenário, funcionando como um vírus que se espalha facilmente ou como uma vacina, que combate a expansão doentia, como uma pandemia.

O que grande número de pessoas não sabe é que o voto é a expressão de poder mais legítima contra verdadeiros atos de terrorismo praticados pelo estado contra o trabalhador brasileiro, a mando do capital privado do nosso país, que se organiza a partir da FIESP na Avenida Paulista. Votar em Antônio Imbassahy, em Lúcio e Geddel Vieira Lima, em João Gualberto, em José Carlos Aleluia e seu filho, em ACM Neto, em Jutahy Magalhães Júnior, em João Leão, em João Gualberto, em Tia Eron, em Irmão Lázaro, em Bispo Marinho, em Mário Negromonte Filho, em Cacá Leão, nos “Lomantos”, no Arthur Maia, Roberto Brito, Benito Gama, João Carlos Bacelar, Paulo Azi, Guilherme Belintani, Bruno Reis, Luiz Argolo, Sérgio Passos, entre outros, é votar:
  • ·        pela manutenção do latifúndio contra a pequena propriedade agrícola
  • ·        pelo domínio do agronegócio em detrimento da agricultura familiar;
  • ·       pelo encarecimento dos juros para empréstimos pessoais nos bancos públicos (Caixa, Banco do Brasil) para sermos obrigados a tomar empréstimos e financiamentos mais caros nos bancos privados (Bradesco, Itaú, etc.)
  •   por benefícios imensos e injustos de empréstimos a juros baixíssimos para grandes empresários do país através do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social)
  • · pela perda de direitos trabalhistas fundamentais ao equilíbrio na relação patrão-empregado, tais como férias, seguro-desemprego, aposentadoria, pagamento de insalubridade, direito a afastamento paternidade e maternidade, etc;
  • ·contra o direito do trabalhador se organizar em sindicatos e associações de sua categoria para defender-se dos ataques patronais;
  • ·pelo domínio dos brancos ricos de São Paulo e do eixo Sul-Sudeste, aliados aos filhos dos antigos coronéis nordestinos e nortistas, sobre os pobres mestiços, negros e indígenas nortistas e nordestinos;
  • ·por hospitais lotados, por falta de enfermeiros/as, médicos/as, auxiliares de enfermagem nas instituições públicas de saúde, forçando você a retirar parte importante do seu orçamento para pagar assistências médicas duvidosas, ou, pior; esperar a morte de seu parente, ou a sua, na entrada dos hospitais, centros e postos de saúde;
  • ·  numa postura policial dúbia, que invade a casa dos pobres a pontapés, agindo com violência desproporcional à situação, matando milhares de jovens negros pelo país afora;
  • pela reprodução de velhas elites regionais, como um gene que se reproduz de pai para filho, pois quando você vota em Cacá Leão, em ACM, o Neto, em Mário Negromonte Filho, em Luiz Argôlo, nos “juninhos” e “filhinhos” de “doutores” "fulanóides” e "doutoras" “sicranóides”, você está ajudando o vírus a se reproduzir com mais força, espalhando a doença que mata a democracia e o povo desse país;
  • · é votar a favor da violência contra as mulheres, contra os homossexuais, contra o respeito às diferenças;
  • ·    contra a educação básica de qualidade para as filhas e os filhos dos/as pobres dos nosso país, que somos nós, que somos a maioria,
  • ·        contra a criação de espaços públicos de debate sobre as diferenças, a diversidade, os grandes temas e problemas de nosso país e de nosso mundo;
  • ·        é votar a favor da privatização de tudo, inclusive da água que você tanto precisa para viver;
  • ·        contra a universidade pública para você e seu/sua filho/a entrar algum dia;
  • ·        contra o avanço do know how científico que poderia dar ao nosso Brasil possibilidade de ser menos dependente da compra e importação de tecnologias produzidas além-mar, enfim, é votar;
  • ·        a favor dos privilégios absurdos dessa corja que infesta atualmente o Congresso Nacional com suas enfermidades morais e éticas;
  • · contra a negritude, as mulheres, os indígenas, os pobres, os nordestinos, os trabalhadores, os/as homossexuais, os idosos, entre outros excluídos, enfim, é votar a favor do seu/nosso sofrimento.     

Desse modo, o voto é esse poder que você tem para decidir o que você quer para você. Se você é masoquista, crie outra forma de se automutilar, de se punir sozinho. E, de certa forma, o voto também é uma questão de identidade política, moral, social, cultural e econômica, pois nele, você escolhe em quem vota em função de quem você pensa que é. Se você é economicamente pobre; se você é nordestino; se você é negro/a, indígena ou mestiço/a como eu; se você é trabalhador/a e vai votar nesses/as candidatos/as acima, perdoe-me, mas você está assumindo uma identidade que só vai comprometer seu futuro e levá-lo à morte prematura e infeliz, porque ficará mais pobre ainda; porque será ainda mais desrespeitado em sua condição humana; porque terá grande probabilidade de morrer antes do primeiro atendimento médico; porque será ainda mais ignorante do que é; porque será empurrado para margens desertas e poluídas, nas quais as doenças afetarão a você e sua família, enfraquecendo ainda mais sua esperança vã.

Cacá Leão, ACM Neto, Luiz Argôlo, e todos os juninhos e filhinhos candidatos a seguirem seus pais são vírus mortais que o voto pode matar (politicamente) como uma vacina. Você decidirá, se quer aplicar a vacina na urna eletrônica, ou se quer reproduzir o vírus que lhe sorri até ser digitado na urna fúnebre. Depois não venha reclamar nem me estender a mão nas esquinas das cidades brasileiras, nem me fazer pedido de doação para o “Criança-Esperança”. Estenda a mão agora, para si mesmo, para os que pertencem à sua identidade marcada pelas condições em que se encontram e abrace a causa de sua raça, de sua classe, de seu gênero, de sua região, de sua esperança compartilhada em ideais comuns. 


Joselito da Nair, do Zé, do Rafael, de Ana Lúcia, de Tantas Gentes, do Nordeste e do Norte do meu país. Com Jesus, O Emanuel, que é um Deus Conosco.    

domingo, 13 de agosto de 2017

VELHOS/AS E NOVOS/AS AMIGOS/AS RUMO NA DIREÇÃO DE DEUS

Tenho amigos/as velhos/as. E não me arrependo dos/as amigos/as que foram ficando comigo durante tanto tempo. Haja paciência! Elas e eles aguentaram todas as bobagens do tempo de bobagens que eu fui sendo desse jeito. E o pior: esse tempo de vez em quando atravessa esse tempo de agora. Mas, de qualquer forma, eu pressinto que elas e eles gostam, em parte, das “aliotrias” do Litinho. Não citarei nomes, porque senão posso estar cometendo uma injustiça enorme. Gosto de todas e de todos. Até algumas pessoas que não gostam de mim, devem ter suas razões, também gosto delas, mas claro, não todas. Percebo cada um/a em sua singularidade insubstituível e, também, identifico suas tolices ingênuas em momentos em que elas e eles se desarmam frente a mim, porque sabem que podem, porque sabem que serão acolhidos/as em meu ser. A idade nos ensina que julgar os/as outros/as não pertence a nós, iguais nas fraquezas que nos dominam.
Somos tão frágeis! E eu me rio quando vejo alguém se achar superior aos demais. É triste e, ao mesmo tempo, engraçado. Algumas vezes é doloroso. Aquele “sentimento oceânico”, do qual nos falava Freud, pode ser tão enganoso. Alguns/mas não aceitam Deus e se sentem deuses/as num “Olimpo” reservado para a glória peculiar que os caracteriza. E, nessa percepção de loucura hitleriana, pensam poder julgar os/as demais como inferiores, como frágeis, como insensatos, como “raças inferiores”. E o pior: não se reconhecem como tais. Acreditam que os/as outros/as são culpados e responsáveis do mundo estar assim, degradado. E outro pior: não conseguem ver a degradação em si mesmos/as; não conseguem ver na degradação a esperança que o mundo sanciona em ações que a mídia teima em não publicar. Há muita coisa boa no mundo. Existem muitas ações de bondade e fraternidade no planeta. Assim como há muitas mortes, traições, frouxidões e enganos, há também muita solidariedade, atos de coragem, exercício da força a serviço dos/as fracos/as. Há muitas ações emocionantes de amor em nossa existência, e é preciso apresentá-las ao mundo como um ato de rebeldia angelical contra a arte demoníaca de enganar os/as viajantes do nosso tempo histórico. Deus existe! E Deus está Vivo!
Eu sou um cara difícil. E não aceito amigos/as novos/as assim tão fácil, embora eu seja fácil no início de toda relação. E, nessa minha facilidade, eu observo quem se aproxima. Observo e anoto em minha memória olhares, bocejos, inclinações que a boca faz, distrações que a palavra faz, rumo à distância – ou à proximidade – entre nós. E eu vejo tudo. Tudo o que eu preciso ver. Já rejeitei algumas pessoas que ficavam próximas à mim como uma doença. Como um câncer, querendo tomar conta de meu ser. Comecei a perceber que a proximidade delas me fazia mal. Comecei a identificar mais profundamente a avaliação que faziam de mim, sempre tendendo à rejeição, ao pré-julgamento sem piedade, sem levar em conta minhas potencialidades e minhas virtudes. E fui observando-as. Fui percebendo a direção que elas tomavam, como se eu precisasse delas. Recebi em minha casa com alegria essas pessoas, embora percebesse um mal-estar, como se a casa não fosse minha, ou pior, como se a casa não devesse ser minha. E entraram com seu mal-estar, causando-me um mal-ficar. Um mal que não dá para medir, um mal que não dá para mostrar, mas um mal que dá para sentir. Então decidi afastar esse mal da minha casa, da minha vida. E decidi ser ignorante. E espero nunca mais cruzar com um mal assim. Talvez muita gente não me entenda. Mas não é preciso. Quem percebe o mal presente, sabe a que estou me referindo. As vezes o mal ri pra você, pra poder se aproximar. Só que o mal não entende o nosso poder de reação.
E aí os/as amigos/as novos/as chegam em nosso destino. Será que mudarão o meu rumo? O Quanto? Para onde? Para quem? Quando? Não saber também é sabedoria. E os/as novos/as poderão ser boas novas. Sim. A idade vai passando e a gente vai ficando mais paciente, mais observador, mais tranquilo, menos ansioso. A gente começa a nadar a favor da corrente. A gente antes disso, começa a identificar o sentido da corrente da vida. E vamos nos deixando ir na mesma direção. Não é fácil saber isso. Não. É preciso um caminho longo, “se eu quiser falar com Deus” (Gilberto Gil). “Se eu quiser falar com Deus” tenho de seguir a corrente da Vida. E, nessa, os/as amigos/as novos/as vão nadando conosco, com alegria e gosto. As vezes erramos a direção, mas reconhecemos isso, e retomamos o caminho do Rio da Vida. E, nesse, os/as amigos/as velhos/as já estão a braços abertos sorrindo a felicidade de estar nessa corrente coerente com a vida em abundância. Todos/as dando braçadas animadas na direção de Deus. E eu, em meio a eles/as, vou nadando abraçado com aquela energia potente que as amigas e os amigos vão gerando comigo, com todos, com o mundo.
Amigos/as que vão se dando através dos olhares, das palavras, dos abraços que vão se demorando de vez em quando quando, vez e outra, há indícios de verdadeiro afeto que se afeta comumente. E esses/as amigos/as vão se juntando nesse rio-mundo que, rumo ao oceano, vamos contentes compartilhando as margens que se oferecem às nossas preces, a Deus que nos oferece a sua justiça e o seu amor; a Deus que nos aparece na Vida em plenitude e abundância que nos reexiste alegremente na comunhão que a amizade nos possibilita. À Deus, a minha vida com os/as amigos/as.

Joselito da Nair, do Zé, da Ana Lúcia, do Rafael de Tantas Gentes Amigas e de Jesus, O Emanuel 

quinta-feira, 10 de agosto de 2017

OS/AS VELHOS/AS EXPRESSAM SUAS VELHICES NA VELHA POLÍTICA

Na próxima eleição irei votar. Não atenderei ao apelo para votarmos nulo. Até entendo a racionalidade que essa revolta nos apresenta. E é esta racionalidade que fundamenta este texto. Votar nas mesmas caras, nesses/as homens e mulheres velho/as que se denominam "candidatos" e, em nome de alguma mentira elaborada pelo marketing político eleitoral, se lançam no mercado eleitoral a fim de serem "eleitos/as".  O grande problema é que esses/as candidatos/as são bem velhos/as. Muito embora a velhice tenha sua sabedoria, para compensar as dores e as reduções de nossas potências físicas e biológicas, essa velhice política termina funcionando como uma barreira à renovação que o campo político no Brasil exige, neste momento de desregulamentação do mercado e retrocesso político nas conquistas dos/as trabalhadores/as e das classes populares.

Parece que a direita política se renova mais depressa que a esquerda. No DEMônio estão aparecendo um tal de Bruno Reis, Guilherme Bellintani, entre outros jovens, liderados por ACM o Neto, que vão atuar na defesa dos princípios neoliberais que a direita baiana prega e luta para assegurar. Mas a oxigenação da esquerda parece muito mais complicada. Desde que sou bem jovenzinho Nelson Pelegrino, Walter Pinheiro, Jacques Wagner, Lídice da Mata, Alice Portugal, Daniel Almeida, Olívia Santana, entre outros e outras, que, de 4 em 4 anos,  lançam suas candidaturas, continuam lançando suas candidaturas eternidade afora. Será que não surgiu nenhum/a jovem promissor/a nessas 3 décadas? Será que os/as jovens desses partidos são pouco inteligentes? Será que esses/as jovens querem apenas exercer a função de distribuir santinho, segurar bandeiras e atuar na organização e execução das campanhas desses/as velhos/as e renitentes guerreiros/as? Faz tempo que não ouço uma voz jovial nesse meio. Quem sobe no trio, passa por uma "triagem". A voz que vem de lá e é distribuída tem de ser a voz de Pelegrino, de Pinheiro, de "da" Mata, de Almeida, de Portugal, de Santana, de Wagner, como se esses partidos, de fato, tivessem seus donos, distribuindo o poder de acordo com o status quo do representante cuja palavra já está resguardada, desde três ou quatro décadas, para ser sempre falada. Mas particularmente, não me convencem mais. Parece que ouço o passado requentado; parece que ouço o futuro represado por malhas de seleção que as operações de poder dentro desses partidos instituem, como se fossem "naturais". 

Muito embora reconheça o papel que os/as mais velhos/as têm, por isso mesmo apreciaria um/a candidato/a desses/as apresentar um/a novo/a candidato/a para nós, como um tutor temporário. Mas o que vejo é que não surgem jovens pronunciando suas revoluções. Como se eles e elas fossem barrados pelas tramas partidárias em seus filtros selecionadores, pela autoridade do momento, que se lança, durante três décadas, candidato/a representante de uma multidão que anseia pela retomada das forças políticas locais, regionais e nacionais. Ora, isso me caracteriza um impedimento, como se esses partidos fossem, eles mesmos, capitanias hereditárias oferecidas aos "eleitos", ou melhor, às/aos candidatas/os de sempre às eleições de sempre.  Fico pensando, do mesmo modo, nesse militância política que opera nesses partidos, como se fossem torcedores fiéis de um/a candidato eterno, vestindo, tal qual um torcedor desvairado, "a camisa" do/a seu/sua candidato/a. Uma esquerda que não se renova me parece suspeita. Muito suspeita. Os/As jovens são "assassinados/as" em suas pretensões eleitorais? 

Por isso não votarei nesses candidatos/as citados/as, muito menos em velhos/as outros/as que requerem reeleição. Caso apresentem jovens, eu votarei e, nesse fenômeno, percebo que o PSOL, por exemplo, dá exemplo de renovação, de mudança de cadeiras e apresentam jovens candidatos. Hilton Coelho não foi mais o "eterno" candidato do partido a prefeito. Foi Fábio Nogueira. E assim vão nos dizendo como um partido não pode se tornar personalista, dependente de um/a eterno/a candidato/a para todo o sempre, amém. A esquerda, precisa voltar a ser esquerda, e o PSOL aponta, nesse sentido, um caminho de renovação. Votarei em Rui para governador, por ser, de certa forma, um jovem nessas três décadas dos mesmos nomes, mas isso, é muito pouco. 

Joselito Manoel de Jesus, (Não é filiado a partido algum, critica quem quer e quando quer) Mas sempre voto na esquerda. 

terça-feira, 8 de agosto de 2017

BRASIL DOS BANDIDOS

Não sei mais qual a vantagem de ser brasileiro. Ando cético quanto a isso. Ando cético quanto ao ser humano, de qualquer lugar do mundo, apesar de Gandhi, de Madre Teresa de Calcutá, de John Lennon, entre outros. Na França os refugiados da Síria estão sendo maltratados quase tanto quanto os judeus na Alemanha de Hitler. Nos Estados Unidos, Trump, aquela figura grotesca de ser humano, tenta a todo custo implantar sua demo-cracia, deixando mexicanos e demais latinos nas margens do novo grande muro de Berlim que ele deseja erguer. Na Palestina, os israelitas massacram os palestinos, mesmo levando em conta a raiva histórica que gera conflitos entre os povos. O mundo é da insensibilidade.

No Brasil até a liberação dos corpos pelo IML (Instituto Médico Legal) do Rio de Janeiro, era feita sob o pagamento de propina. No governo a bandidagem continua julgando a si própria, com apoio de um conhecido ministro indecente do STF (Supremo Tribunal Federal) e o PCC (Primeiro Comando da Capital) vai ter campo aberto para financiar campanhas políticas em 2018. O Brasil é dos bandidos! Os bandidos fazem as leis, os bandidos se elegem, os bandidos se protegem, os bandidos se completam. Ser brasileiro está a cada dia mais difícil. Pagamos o preço exorbitante de um estado falido, como um Titanic cujo rombo está aumentando e as classes que se encontram mais abaixo estão morrendo afogadas, enquanto as classes mais acima lutam para fugir nos botes que restam. Mesmo as que conseguem chegar à fila dos pretensos ocupantes desses botes, são impedidos pelo aparato militar desse navio rumo à tragédia. O Rio de Janeiro atolou com a lama que veio da barragem do Ex-governador/Presidiário Sérgio Cabral e outro Sérgio, o Moro, finge querer combater a corrupção de um partido só, o PT, enquanto o STF libera Aécio, a mafiosa irmã dele e o Lores de Temer. 

Haverá uma tragédia, e isso só não vê quem não quer. Em breve aqueles/as que poderão morrer afogados, quando perceberem a água subindo sem trégua, lutarão, inevitavelmente, pelas suas vidas. E, quando o aparato militar se colocar em seu caminho, sem terem lido A Arte da Guerra, de Sun Tzu, perceberão o que o medo faz com uma multidão de seres humanos. E serão trucidados pela fúria humana com uma única direção: sobreviver. E não serão brasileiros nessa hora. E não serão nem humanos nesse momento. Serão seres vivos querendo viver. Porque saberão em suas peles e em suas fomes, em suas dores e em suas lágrimas, em suas injustiças e em suas mortes, que não são brasileiros/as. Que não adianta nascer nesse território, porque nele, são tratados como estranhos, como escravos, como massa de manobra da guerra e da morte.

De que vale a pena ser brasileiro? Vale a pena ser alvo de tantas mentiras? Tanto à esquerda quanto à direita? Vale a pena ser brasileiro? Sendo taxado por tantos impostos, por tantas propinas, por tantas taxas? Falam que na Venezuela têm uma ditadura. E no Brasil tem o que? Uma dita mole? Uma rapadura? A gente pode votar em quem não é financiado por grandes corporações? A gente pode votar em quem não defende o capital privado? A gente pode votar em quem não é financiado pelo crime organizado? A gente pode votar em quem não é apoiado pela Rede Globo ou pela Record? Enfim, a gente pode votar na gente? Nãããããããããããooooooooooo! Aí se reelegem um bando de supostos evangélicos de fachada, com discursos moralistas fáceis [Tia Eron, Irmão Lázaro, Marcos Feliciano, Pastor Isidório, Pastor Fulano, Pastor Sicrano, Bispa Beltrana etc.) que depois votarão contra os verdadeiros evangélicos, cuja fé não se vende por trinta moedas; aí se reelegem candidatos apoiados pelas grandes corporações; aí se reelegem vereadores, deputados e senadores apoiados pelo crime organizado e pela grande máfia que é a governança desse país.  

Tenho vergonha de ir a outros países e responder à perguntar a que lugar do mundo pertenço. Não pela minha gente, não pela negritude, não pela nossa rica cultura, não pela favela, não pelo Calafate. Mas por quem nos governa. Todo o sistema: judiciário, executivo e legislativo. Todo o sistema. Também teria vergonha de ser francês nesse momento. Seria agora muito mais alemão que outra coisa. Gosto do humor inglês, mas não do mal estar deles em relação aos outros. Gosto dos africanos, por causa da minha cidade, Salvador, que me mostrou a solidariedade, a alegria, a força, a fé, a sabedoria e a resistência negra. Gosto dos noruegueses, por causa da força e do destemor dos vikings, coisa que falta ao nosso povo brasileiro. Gosto do nosso planeta e de tantos e tantos povos que nele estão, por ser o único, até agora, deste universo.

Mas, voltando a este país, detesto! Um país frágil! De políticos desonestos e mentirosos, ladrões do suor da população, cujas gravatas foram pagas por nosso trabalho. Raros são dignos de reconhecimento e honra. Raros. Estou cansado disso tudo, desse teatro sem graça com canastrões muito bem pagos pelo nosso ingresso forçado. Um país que não reage, que morre como um sapo na água que vai fervendo a seus pés. Um país cheio de afogados boiando no oceano de nossa história. Um país sem revolta, sem balaiada, sem sabinada, sem marinheiros, porque eles se jogaram na água atrás de salvação, que não existe nas águas gélidas da reforma previdenciária e trabalhista, que não existe na reforma política feita pelos ladrões que vieram de Portugal e aqui fizeram “sua ordem” e “seu progresso”. Nesse sentido, eu não sou brasileiro. Sou estranho nessa terra de “Santa Cruz” que precisa ser redescoberta pelo seu próprio povo.


Joselito Manoel de Jesus, estranho estrangeiro

sábado, 22 de julho de 2017

MORTE E VIDA JOSELITO

Uma parte de mim está morrendo. E é sempre triste e difícil morrer,
mesmo uma parte que deve me deixar para sempre, porque tudo quer continuar vivendo, mesmo nossas partes psíquicas.
Essa parte foi um sonho que cresceu em mim. Mesmo sem aquela educação que essa parte precisava ter para sonhar como ser integral. E, como cresceu em mim, alimentada pelos meus próprios sonhos, não percebi que meus pesadelos também estavam ali, nutrindo-a. Como um/a ingênuo/a pai/mãe, só quis ver nessa parte a parte bela dos meus sonhos. Ignorei o lado sombrio da minha acalentada parte que crescia sem a disciplina necessária do meu aparelho psíquico.
E então, quando senti as dores dessa parte que emanava do meu ser, passei um longo tempo sofrendo sem saber o que fazer. Talvez porque me recusava a identificar sua origem e reconhecer os assombros que essa parte revelava. Até que, enfim, fui forçado a olhar no Espelho Meu que dizia para mim: - Tem uma parte necrosada no seu eu. Uma parte que precisa ser retirada, para que você não seja por ela inteiramente tomado.
Que revelação dolorosa! Saber que uma parte de mim, que eu sonhara como projeto emancipatório da minha singularidade, se corrompera, tal como os representantes políticos do meu país. Tal como eles, mas não como eles. Não como ninguém. E ter de se despedir dessa parte está sendo a parte mais dolorosa de meu trajeto neste momento. Mas, como em toda dor há sempre um ensinamento e uma possibilidade de aprendizagem, estou acalentando também a esperança de poder sonhar novamente sobre outras bases humanas. Está sendo a abertura de um caminho ainda não percorrido que pode me levar ao Espelho Meu sem o temor de sua avaliação rigorosa e impiedosa.
A partir de agora, quem sabe eu não me olhe por dentro de outra história? O que sonhei e que estou abandonando, não foi de todo mal. Foi aquela esperança que se tornou ingênua diante de avaliações errôneas dos contextos em que me inseria. Foi aquela ingenuidade que se tornou vaidosa e aquela vaidade que se tornou raivosa e pirracenta.
A partir de agora, que descansem em paz os mortos dentro de mim. Mortos de uma parte do meu sentir, do meu saber, da minha ignorância, enfim, do meu viver. Vou enterrá-los nesta solenidade de palavras encadeadas com seu propósito. E vou deixá-los partir, para que, assim, possam me deixar ficar, para que nasçam inteirezas que me componham a subjetividade historicamente concebida.


Joselito Manoel de Jesus