segunda-feira, 15 de setembro de 2014

POLÍTICA E RELIGIÃO NO BRASIL CONTEMPORÂNEO




Diferentemente do comunismo, um mito capaz de seduzir muita gente com seu sonho igualitarista, o fundamentalismo religioso islâmico, hoje o principal adversário da civilização, só pode convencer os já convencidos. (Mario Vargas Llosa)

Religião, pelo que me lembro, é religação. Religação entre terra e céu, Deus e ser humano, pão e oração. Mas, que ser humano? Que Deus? E, quando fazemos essas perguntas, o caldo entorna. A religião se torna prenúncio de guerra. Não há uma só religião, nem há um ser humano padrão, nem há apenas uma concepção de Deus e, por isso mesmo, não há uma religião ou “A” religião. Mas há aqueles e aquelas que consideram a sua religião como “A” religião, onde os sensatos e fiéis devem congregar para alcançar a vida eterna, ou seja lá o que se passe pela cabeça deles e delas.

Logo, os que não seguirem a “minha”, a “nossa” religião, que é a verdadeira, a original, com selo de qualidade de pureza santa, são os ímpios, os impostores, os “falsos profetas”. Então, todos os esforços devem ser feitos para limpar a terra dessas "excrescências diabólicas" que ofendem a nossa concepção do sagrado. Pois é isso que está fazendo um candidato pastor, Elionai Muralha, do PRTB, conforme reportagem do A Tarde do dia 6/9/2014. Este candidato quer a retirada das esculturas dos orixás do Dique do Tororó e imagens de orixás de espaços públicos, em Salvador, Bahia. Alega que o Estado é laico. Por esse pensamento a estátua do Cristo Redentor, no Rio de Janeiro, também deveria ser demolida, pois o estado não pode ser laico apenas para ele e para seu "cristianismo de resultados", eleitoreiros, por sinal.

Claro, com um sujeito desses – que eu não sei bem classificar se é fundamentalista louco ou se é apenas um oportunista eleitoreiro, como é mais comum em nosso país – não dá para estabelecer diálogo. Mas dá para antecipar-se ao que pode vir a acontecer num futuro próximo com o fortalecimento de correntes religiosas na sociedade política, ou seja: nas estruturas de poder do estado. Eu não pertenço a religiões afro-brasileiras, mas defendo o direito dessas religiões terem reconhecidos seus símbolos religiosos em espaços públicos. Aqui em Jacobina tem a “Praça da Bíblia” e o Cruzeiro, este último um dos principais símbolos da cidade, e nunca vi um evangélico ou católico ser contra a sua criação e institucionalização. E concordo que seja assim.

Esse pastor não apresenta e nem deve conhecer a história de nossa gente, que é principalmente, não apenas a história dos brancos, mas também, sobretudo na Bahia, a história da África e dos africanos no Brasil e na Bahia, porque desconhece o sofrimento de quem foi negado em suas crenças, em seus símbolos, em suas construções subjetivas, além das inúmeras atrocidades que sofreram/sofremos. Fico fazendo um devaneio de outras possibilidades históricas. Ao invés de termos sidos colonizados por portugueses, poderíamos ter sidos colonizados por africanos, de algum país a oeste deste continente. Qual seria a nossa língua? Qual seria o nosso padrão de beleza? Teríamos um padrão estético? Qual seria a nossa religião? Como seria a nossa relação com os indígenas? Creio que reuniríamos a família e iríamos aos terreiros de candomblé ou de umbanda, caso existissem, para exercer nossa fé comunitária, sem problema algum, pois o diabo não foi Exú nem os africanos quem inventaram: foram os brancos de outrora. Foi a sociedade branca e racista que associou ideologicamente o candomblé e a umbanda com o que é demoníaco. Pois eu vejo o candomblé e a umbanda como expressões de povos, comunidades religiosas, grupos e pessoas, de suas relações com o SAGRADO, assim como fazem evangélicos e católicos.

Tenho grande preocupação com esse tema, pois percebo que podemos ter a nossa “guerra santa” ainda em breve, caso o Estado não coíba iniciativas desse tipo, que estão ficando cada vez mais ousadas e desrespeitosas, por causa da crescente bancada evangélica na sociedade política do Brasil. Já temos problemas demais, como o racismo, a homofobia, a qualidade de nossa saúde, nossa educação, a condição do nosso sistema presidiário, nossa insegurança pública, a corrupção institucionalizada, o sistema penal frouxo, entre tantos outros. Tem pastores de tv, aliás milionários com o dinheiro da inocente fé alheia, que se preocupam mais com os homossexuais e com o diabo que terminam se esquecendo do Próprio Deus. A criação do Partido Popular da Liberdade de Expressão (Pepelê) vem em boa hora nos representar contra essa sanha populista de candidatos que procuram eleger-se com propostas estapafúrdias, mas polêmicas, que eles e elas sabem, irá atingir ideologicamente muitos evangélicos e católicos que converterão seus medos diante de temas considerados apocalípticos em votos fáceis para suas eleições. Esses(as) idiotas metidos (as) a espertos (as), mal sabem que estão plantando não a semente da paz, do respeito às diferenças, da compreensão e do amor diante da convivência, mas a semente do ódio, do racismo e da guerra que virá, se essas sementes germinarem no terreno da ignorância  e do ódio historicamente alimentado por ideologias racistas. Deus passa longe, bem longe, desses pastores da extinção dos (as) outros (as).

VIVA O PEPELÊ!!! VIVA A LEI 10.639/03! VIVA AS RELIGIÕES AFRO-BRASILEIRAS!!! VIVA DEUS, EM TODA FORMA DE EXPRESSÃO!

Joselito da Nair, do Zé, do Rafael, de Ana Lúcia, de Tantas Gentes e de Jesus, O Emanuel.