Estou em um momento em que procuro sentidos para a vida. Há
uma tristeza enorme manifestando o mundo que percebo. Sinto uma perdição geral.
Sinto um desabamento humano produzindo unidades de consumo, prazer, futilidade e delírio
tão vazias de sentido que somente o desencanto vai expressando minha
desesperança crescente. Há muitas mortes. Assassinatos, crueldades, cinismos,
negligências. Mas a morte não me parece tão ruim. A morte e a vida estão de
mãos dadas num abraço sem fim. A morte somente acabará quando a vida atingir um
fim, porque essa morte sempre tem o seu intérprete. A pior morte de todas é
aquela para a qual não há quem a lamente. É a morte da morte. A morte da
humanidade. A morte tornou-se banal, e o pior, está sendo cultivada dentro de
nós quando o tecido da humanidade se rompe, provocando um rasgo tão grande que
talvez seja difícil costurá-lo novamente.
Talvez estejamos cultivando um sentimento nazista em nosso
comportamento que não mais se indigna com a injustiça, com tantos assassinatos
e mortes prematuras. As pessoas sofrem e caem ao nosso lado, mas não mais nos
envolvemos. Criamos uma carapaça em torno dos nossos sentimentos na tentativa
de nos proteger, de nos salvar da insanidade geral que toma conta de nosso cotidiano,
mas, ao fazermos isso, participamos desse ato geral de indiferença que fulmina
a humanidade que talvez ainda nos reste, asfixiados na câmara de gás criada
por nós mesmos diante do mal que se avizinha. Estamos todos perdidos: povo, cientistas,
comunicadores, religiosos, médicos, policiais, enfermeiros, auxiliares, juízes,
professores, etc. Cada qual procura sobreviver nos estacionamentos, nas ruas,
no lar, nas instituições de trabalho. Mas talvez estejamos sentindo que a
humanidade que ainda nos resta está se perdendo cada vez mais abismo adentro do
mundo que estamos criando em nosso processo destrutivo.
Sinto-me tomado por profunda tristeza. Sinto-me cada vez
mais impotente. Percebo cada vez mais que o cinismo tomou o lugar da honra, que
a mentira prevalece, que a justiça está tomada pelos/as indecentes, que os
canalhas estão nos roubando até Deus e seu profundo sentido ontológico, transformando-o
numa mercadoria fácil que se pode comprar e vender nas prateleiras de igrejas-mercado.
A insatisfação está sendo silenciada pelos ruídos ensurdecedores das promoções,
das propagandas, filmes e novelas. O campo da política foi tomado de assalto
pelos marginais que nos governam desde que os portugueses começaram a levar
nosso ouro para lá. E é justamente nesse campo que uma das maiores batalhas
está sendo travada. Esse campo cerrado pelo financiamento criminoso, criando um
círculo vicioso que se retroalimenta por um povo ainda frágil, pequeno e
mesquinho, que ainda admira o herói, ou mesmo o anti-herói, pré-fabricado pela
mídia, renovando o seu poder num congresso cheio de ladrões que levam nosso ouro
para lá, as contas fantasmas que alimentam dondocas de olhos esbugalhados no
dinheiro surrupiado de nossa nação.
Minha esperança está tão frágil num momento em que precisava estar tão fortalecida. Há uma guerra dentro de mim mesmo. Há explosões, conflitos, bombardeios, trincheiras e mortes. Existiam sujeitos que foram morrendo em meu ser. Sujeitos que, ao morrerem, tiveram de enterrar também as ligações que ainda existiam com certas pessoas, porque a confiança foi se perdendo devido à identificação de suas hipocrisias e cegueiras, e deixamos de partilhar os fios tênues que a história nos concedeu em outro momento da minha vida. Na rigidez fria de suas mortes as pronúncias desses sujeitos, que em mim se extinguiram, foram para o túmulo de um silêncio fúnebre que rejeitam até a cruz, porque não mais sonham com a promessa da ressurreição num mundo que desabou. Aonde renascerei?
Se no mundo não há sinais, olho para o céu, à procura de esperança,
como um navegador num oceano imenso no meio da noite. As estrelas tão distantes, brilham
indiferentes para um planeta azul que é belo e pacífico para acolher a vida em
sua exuberância, mas, cujo mundo criado pelo ser humano se tornou num dos
lugares mais agressivos e mortais do universo por causa da gente, os seres
desumanos.
Joselito desse mundo.