sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

CATÓLICA DE LÁ, CATÓLICA DE CÁ (continuação)


Dessas minhas andanças nas Católicas tirei duas lições preciosas: a primeira é que todo movimento, por menos organizado que seja e por menos componentes que tenha, provoca mudanças. Mudanças que as vezes não percebemos, principalmente quando estamos afoitos em apressar o passo do processo de uma maneira irrefletida. Na Faculdade de Educação da UCSal conseguimos provocar mudanças no currículo, embora tivessem sido paradoxais. Entretanto nos mostrou que nossa ação política dá resultados, muda alguma coisa que, se for bem aproveitada, tanto como reflexão, como mudança concreta, pode desencadear outras mudanças mais amplas. Digo que foi paradoxal porque foi introduzido no currículo, a disciplina “interdisciplinaridade”. Nessa disciplina tinha um amontoado de conteúdos: lingüística, alfabetização, psicologia da aprendizagem, etc... “Remendo novo em roupa velha.” Foi implantado. Sem consulta à comunidade acadêmica. Entretanto, por mais paradoxal que seja, foi um sinal vivo de que nossa luta tinha pertinência e que devíamos continuar naquele caminho, ademais éramos os principais interessados naquelas mudanças qualitativas/quantitativas. Mas deixamos escapar aquela oportunidade de refletir sobre esse fenômeno. Perdemo-nos em outras mil e uma coisas dos nossos afazeres.
Na Católica de Cá foi assim. Contudo e com todos, foi na dinâmica da participação nessa instituição que fui tomando consciência das mazelas da Católica de Lá. O professor Georgehocoama foi um dos sujeitos que mais me ajudou a ensaiar uma reflexão “saviana”: radical, rigorosa e de conjunto. –“Meu filho”, dizia ele, “no dia que a Igreja se colocar contra o Estado este fecha suas portas..." Eu retrucava, mas suas palavras faziam eco em mim. Já não conseguia considerar minha participação na eclesia do mesmo jeito. Aliados vieram em meu socorro: Althusser, Bordieu, Gramsci, Habermas, Saviani, Paulo Freire e outros, foram fazendo com que eu percebesse a Igreja com uma visão panorâmica, de cima, de dentro/fora, de fora/dentro. Essa visão me permitiu um retorno dialético sobre a Católica de Lá. Um retorno crítico, defeituoso, cheio de imperfeições, mas autêntico, construído com os calos de minha mão, com minhas próprias digitais, com minhas marcas pela trajetória que trilhei.
Mas eu também aprendi minha segunda lição. Toda instituição, por mais democrática que diga ser, por mais participação que diga requerer dos seus componentes, se nega a aceitar a crítica, quando esta penetra em sua ferida exposta que, contudo, fingem não ver. Com a Igreja não é diferente: Ela gosta é de ovelhas, seres que precisam de pastores para serem conduzidos. Quando deixamos de ser ovelhas e vamos passando a ser “filhos pródigos” a Eclesia, com muitos métodos diferentes, conscientes ou não, vai nos expulsando. Isto não acontece somente com as “piabas” da poderosa instituição. Acontece com padres, freiras, bispos, cardeais, até com papas! Leonardo Boff que o diga! A Católica de Lá não gosta de quem pensa diferente. Ela não acolhe o diferente. Até pra dialogar se constitui numa tarefa árida. Não acolhe o rebelde, o contraditório, muito embora ela seja uma das instituições mais contraditórias e paradoxais que existam. Só de pensar no processo de colonização, só de pensar nas inquisições, nas cruzadas de ontem e de hoje, sinto que minha palavra não está tão distante assim da realidade factual. Todos esses séculos de existência da Igreja não amadureceram sua capacidade de dialogar com o diferente. Ainda é uma instituição hermética. Quer conquistar as “almas” para si, com o pressuposto de que é para Deus. Quem busca converter, se esquece de que o outro pode não querer ser convertido, se esquece que o outro é gente, que pensa, que tem uma história, que tem uma memória valiosa; se esquece que o outro não é ovelha e, nesses esquecimentos todos, se esquece de dialogar.
Nessas andanças entre a Católica de Lá e a Católica de Cá fui me forjando, me apresentando, me re-criando, me reduzindo, me expandindo, me aumentando, me refazendo. Quanto às Católicas, a de Lá e a de Cá, se perderam no giro da “Roda Viva” de Chico Buarque. Suas propostas não atraem mais os espíritos inquietos. Nem “poetas, nem guerreiros, nem profetas”. Suas propostas estão muitos distantes daquele Cristo revolucionário, poético, profético, guerreiro. As Católicas, por incrível que possa parecer, terminaram por matar aquele que devia nos libertar. O Cristo, o verdadeiro. Não são padres saltitantes, produtos da mídia, que vão redimir o catolicismo de suas mazelas e de sua marcha para a sua reprodução, pois é só isto que as interessa: sua reprodução e sua hegemonia na sociedade. Uma, a hegemonia de outorgar diplomas, de permitir o exercício da “profissão”; a outra a hegemonia de outorgar a “salvação”.

Joselito da Nair, do Zé, do Rafael, de Ana Lúcia, de Tantas Gentes e de Jesus, O Emanuel

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