Por causa
da recente eleição do Papa, um argentino, alguns brasileiros, famosos ou não,
utilizam da velha máxima de que Deus é brasileiro, desdenhando jocosamente da
nacionalidade do novo Papa. Acredito que essa afirmação de que Deus tem uma
preferência especial por nós talvez venha do reconhecimento de que nosso país
não tem os problemas naturais que outros países têm, como terremotos, furacões,
vulcões nem tornados, capazes de aniquilar milhares de seres humanos em tempo
bastante curto. Nosso país é cheio de riquezas naturais, minerais, com um clima
apropriado para o desenvolvimento agrícola, para a pecuária, com grandes
reservas e a maior floresta do mundo, entrecortada por rios e mais rios, sendo
a maior reserva de água doce na superfície do mundo, senão me engano. Assim,
Deus, por abençoar estas paragens, estaria oferecendo um indício claro de sua
predileção pelo nosso país e pelo seu povo. Logo, para nosso júbilo – para
utilizar uma palavra bem religiosa – Deus é brasileiro.
Contudo, desconfio
que Deus não tem predileção por povo algum na face da terra, apesar de alguns
acharem isso. Deus tem predileção pelo ser humano. Pensa na humanidade, em
qualquer lugar do mundo onde a mesma esteja. E, segundo se conta e reconta, faz
um esforço tremendo para se aproximar dela. Porque a ama. Quando a gente ama é
assim. Queremos estar perto, queremos abraçar e partilhar as maravilhas de
todas as coisas e acontecimentos. Teve um na Índia, que construiu até um famoso
palácio para homenagear sua saudosa esposa amada. O amor produz forças
insuspeitas.
Nesse
território do mundo denominado de Brasil, tem muitas riquezas e belezas
naturais e minerais, também tem muita coisa ruim. Melhor: tem muito “coisa
ruim”. Este país tem sucessivos governos que mentem, que compram propagandas
para divulgar sobre o que não existe, sobre o que não fizeram. A maioria das
obras está “em andamento”. Exceto obras como aqui na Bahia, a Nova Fonte Nova
ou o Maracanã, no Rio de Janeiro. Que não trarão benefício significativo para a
população, só circo, porque o pão está garantido pelo “bolsa família”. Deus não
pode ser brasileiro. Sendo amoroso e onipotente Ele não aceitaria crianças
soterradas no Rio de Janeiro e crianças esfomeadas no Nordeste, porque nossos
governantes alegam não ter recursos para cuidar de seu povo, ou pior: ao invés
de socorrerem sua gente, fazem propaganda afirmando que estão socorrendo,
liberando verbas tardiamente – porque não liberaram antes? –, mobilizando a
Defesa Civil, os Bombeiros, o diabo a quatro. Ou seja: mentindo.
Sérgio
Cabral mente tanto quanto Jacques Wagner, tanto quanto Geraldo Alckmin. São
todos uns mentirosos. E Dilma também aprendeu essa principal, usual e
fundamental ferramenta política: a mentira oficial. A tão debatida, discutida e
imposta transposição do Rio São Francisco, está virando ruína, bem como o metrô
– metrinho, quase centímetro – de Salvador; e tantas e tantas obras que
enferrujam e apodrecem a céu aberto, esperando mais dinheiro para irrigar a
ganância de empreiteiros, políticos e banqueiros. As imagens e as fotografias
mostram a morte, o abandono, o desespero, a violência – Bahia está em 4.º lugar
no ranking de homicídios (Fonte: Instituto Sangari e Ministério da Justiça,
levando em consideração estatísticas de 2010 – o desmatamento, a poluição, o
cinismo, a corrupção, a impunidade, a falência das instituições, entre outras
tantas mazelas, mas a propaganda oficial afirma que vai tudo bem. Quem é
esquizofrênico? Caso tudo fosse bem, como se propagandeia, o governo poderia retirar
o Bolsa Família e,voilá! Muitos brasileiros poderiam andar com as
próprias pernas.
Deus
passa bem longe disto tudo, de toda essa mentirada oficial, de todo esse
cinismo político. O que temos aqui é muita farsa. Farsa na saúde pública. Quem
precisa de hospitais, médicos e emergências que o diga. No Rio de Janeiro,
segundo a reportagem de uma emissora televisiva, crianças estão morrendo porque
o único hospital do Estado que fazia transplantes de rins não mais o faz, por
causa do pedido de demissão de médicos especializados, com certeza
insatisfeitos com as condições de trabalho e de piso salarial; farsa na
educação, porque o analfabetismo funcional avança universidade adentro; farsa
na segurança pública, porque a Secretaria de Segurança Pública da Bahia já
admitiu seu fracasso em combater o crime ao sugerir que levemos o “bolsa ladrão”
para que não sejamos espancados ou mortos. Aliás, os dados falam por si. Nosso
IDH, no ranking do Programa das Nações Unidas, não alcança a média da América
Latina, ficando abaixo de países como o Chile, o México e o país do Papa.
Farsa, ilusionismo, enfim, mentira mesmo, mentira em todas as emissoras de
rádios, de tv e também nos jornais.
Como é
que Deus pode ser brasileiro num mundo onde as enchentes, enxurradas, secas, violências
de todos os tipos produzem um grande sofrimento com a produção de corpos e mais
corpos de anciãos, jovens, crianças e adultos que sucumbem diante das forças
satânicas dos nossos governantes? Nunca vi um governante nosso pedir desculpas
pelo sofrimento do seu povo. Quanta gente não morreu e quantas não estão
morrendo e, ano que vem, vão morrer pelas chuvas que cairão e que não cairão? A
morte virá. Depois as verbas serão liberadas e os governa dores irão, de
helicópteros, sobrevoar a área atingida. E Deus, acima deles, não tem nada a
ver com isso. Ele não é brasileiro, nós não o elegemos e não é Sua vontade a
morte prematura – ou o assassinato por negligência mesmo! – de inocentes. A
maior catástrofe de nosso país não vem da natureza, nem da seca, nem da chuva.
Joselito
Manoel
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