quarta-feira, 6 de agosto de 2014

SININHO, OS BLACK BLOCS E A TERRA DO NUNCA


 É uma confusão. Aparentemente não dá pra entender direito o que está acontecendo e, por isso, escrevo. Quando escrevo registro meu pensamento e depois posso olhar para ele, corrigi-lo, reencaminhá-lo, ou mesmo endurecer ainda mais o tom ou, simplesmente, deixá-lo em paz. 

As manifestações de junho do ano passado, para mim, foram a mais criativa e inovada forma de expressão política dos últimos tempos nesse país. Nelas não tiveram líderes, não houveram vozes únicas, nem palanques para essas vozes "tomarem corpo", nem heróis. Houve, e ainda há, um povo indignado querendo mudanças urgentes em nosso sistema político, jurídico, de saúde, de educação e de segurança, que afetam mais imediatamente a população, além de indignação perante o controle dos corpos e da sexualidade. 

Foi um movimento político livre, anárquico, plural, livre de amarras institucionais que apreendem e silenciam as múltiplas vozes em seus direcionamentos e princípios. Nada de igrejas, nada de partidos, pouco de movimentos sociais, muito da espontaneidade da indignação popular com esse modo de administrar o país. Até aparecer "a turma da Mônica", digo, a Turma da Sininho: os black blocs. Terminaram esvaziando as manifestações populares com seu modo de fazer política. Atirando pedras em vidraçaria de lojas, queimando automóveis, depredando o patrimônio público, destruindo bancas de revistas, barracas, etc. Apelam para a violência que, certamente, está justificada pela “ditadura do proletariado”. Fico pensando: será que essa turma da Sininho está certa? Será que é assim que tem que ser? Na violência? 

Por outro lado penso também: os políticos estão depredando o patrimônio público com uma virulência ainda maior. Só para citar um exemplo, o pior prefeito que tivemos em Salvador – João Henrique Carneiro – depredou muitas construções históricas, que caiam de abandonadas, escoradas na incompetência de um governo fraco, que desprezou nossa história e nossa cidade. Os facínoras do Congresso Nacional depredam o país, minando o orçamento anual do governo federal com propostas de verbas que desaparecem no ralo da corrupção generalizada. O governo Fernando Henrique Cardoso depredou várias empresas públicas, não simplesmente por as terem privatizado, mas por entregá-las a baixo custo para a concentração de riqueza nas mãos de uns poucos. O governo do PT depreda a Petrobrás e outras empresas públicas e nós, os contribuintes aqui de baixo, pagamos, com impostos altíssimos, a farra generalizada com a nossa riqueza produzida todos os dias nesse país. Banqueiros, empreiteiros, donos de empresas de ônibus intermunicipal e interestadual, e donos (as) de igrejas não têm do que reclamar.

A Turma da Sininho e a Terra do Nunca

Com Sininho e sua turma penso que, chega um momento em nossa vida em que gostaríamos de jogar um avião naquele Congresso Nacional de Meliantes, em dias de votação do orçamento da União, a fim de acabar com aquela corja que nos governa, com raras exceções, como Pedro Simon que agora se aposenta. O cinismo deles (as) é asqueroso e nos provoca os instintos mais violentos. Sei que não é por aí, pois a lembrar do saudoso João Ubaldo Ribeiro, os nossos representantes políticos não são de Marte. De certa forma eles e elas, de fato, nos representam. São daqui mesmo e, se não há uma reação forte contra isso é porque aceitamos esse modo de representatividade. Desconfio que "a turma da Sininho" atua mais para o lado da desmobilização popular do que o que dizem pregar. Querem transformar as ruas em uma “Faixa de Gaza”, com o povo no meio a servir-lhes de coadjuvante e de escudo, e, eles e elas, ora fazendo o papel de mártires, ora o de heróis. Fico pensando no país que essa turma deseja: que direcionamento político, econômico, social e cultural essa turma daria se chegasse ao poder político hegemônico? Caminharíamos para a extinta União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, para o bolivarianismo aqui do lado ou para o modelo cubano de administrar? Teríamos a nossa singular “ditadura do proletariado”? Ou construiríamos um modelo histórico utópico em direção à “Terra do Nunca” com Sininho e sua turma nos governando? Bom, pelo que vejo em alguns discursos e ações dessa gente, democracia, participação, autonomia e decisão coletiva não combina bem com elas e eles. Simplesmente porque, segundo as mesmas e os mesmos, a “verdade histórica” está com elas e com eles. Quem discorda deixa de ser ouvido e é marginalizado, porque somente um discurso é admitido, o delas e o deles, que se institucionalizaria num partido único. Para elas e eles, o povo não entende o que está acontecendo e vai à reboque, conduzidos para a “Terra do Nunca”, onde meninos e meninas de outro tempo, com sua vontade de verdade, ainda não cresceram e revivem a "glória do proletariado" que o muro de Berlim deixou para trás.

O capitalismo não acabou e a opressão continua, mas seria de bom alvitre deixar a população pronunciar seus inúmeros discursos, sem a necessidade de colocar a violência como ingrediente nessa vontade de poder e de verdade que anima discursos e ações insanas. Eu, penso como Jorge Amado, tenho mais medo da ditadura de esquerda que da ditadura de direita. Nesta última, caso a gente discorde, morremos como heróis; na primeira, como traidores da “causa revolucionária do proletariado nacional”.

Não se pode admitir que o autoritarismo ideológico, apoiado em milícias armadas e delinquentes, roubem as legítimas bandeiras da cidadania. Os protestos de rua, pacíficos e democráticos, são legítimos e necessários. Verbas públicas, desviadas da saúde, da educação, da agricultura, engordam as contas dos parasitas da República e emagrecem a vida e a esperança dos brasileiros. Se o dinheiro que circula no mercado da corrupção fosse usado para fazer investimentos públicos, mudaria a cara do Brasil e faria, de fato, a almejada justiça social. (DI FRANCO, 2014, p.A3)

Sininho e sua turminha "revolucionária" atuam mais no sentido de retirar a população indignada do palco social da história, quando ela, e os seus, ocupa esse palco de forma grotesca, pouca elegância, inteligência medíocre e sapiência nula, representando um papel que em nada agrada o público que gostaria de atuar de outra forma - como de fato o fez com cartazes e faixas de múltiplas cores e frases inteligentíssimas - aplaudindo o espetáculo que ele mesmo protagonizou. Uma banana para bandeiras de uma só cor. Uma banana para o "caminhando e cantando e seguindo a canção..." Queremos todas as cores, todas as músicas, todos os caminhos, todos os destinos que se fizerem presentes!

Fico preocupado com os inúmeros candidatos a “Peter Pan” que irão colocar suas propagandas na TV, no rádio e nos demais meios a fim de nos oferecer a “Terra do Nunca” como recompensa por nossos votos infantis que ainda acreditam em fadas e duendes para governarem nosso imaginário rumo a ideologias de “Capitão Gancho”.

Joselito da Nair, do Zé, do Rafael, de Ana Lúcia, de Tantas Gentes e de Jesus, O Emanuel

DI FRANCO, Carlos Alberto. Ativistas, militantes e criminosos. A Tarde. Salvador, segunda-feira, 4/8/2014. 

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