Como falei para
vocês em sala de aula, avaliação, para mim, não é um instrumento árido,
classificatório, seletivo e excludente. Se assim o fosse eu não estaria
educando, mas adestrando, ensinando a subserviência e contribuindo enormemente
para a apatia intelectual de vocês, posto que estaria recriando, através da
prática avaliativa, as condições que reproduzem os valores capitalistas que
hierarquizam pessoas, grupos, comunidades e instituições. Estaria fortalecendo
a competitividade darwiniana que o capitalismo selvagem propõe como modelo
ideal para pautar as relações humanas, o que é deprimente. Nesse modelo, convencer tem o sentido de vencer o/a
outro/a, derrotá-lo/a, fenômeno no qual o/a melhor se estabelece em sua “glória”
e “apogeu” e, do/a segundo/a colocado/a em diante, resta o banimento para as
periferias da existência.
Contudo,
recusando esse modus vivendi competitivo,
podemos, mesmo num simples gesto avaliativo, redirecionarmos,
revolucionariamente, o sentido de “convencer”,
na perspectiva de vencer com o/a outro/a,
recuperando, por dentro desse singelo ato educativo que é a avaliação educacional, o gesto político da
solidariedade que nos aproxima humildemente uns/umas dos/as outros/as, no
reconhecimento de nossa condição de classe, de raça, de gênero e de cultura,
afinal, somos pobres, somos negros, indígenas e mestiços, somos aqueles/as que
sofrem as consequências perniciosas desse modo de organização e estruturação econômica e social pelos poderes dominantes. E o principal: não podemos nos esquecer disso quando
ocupamos a condição de sujeitos institucionais mediados pela escola ou pela
universidade. Sendo professores/as e estudantes não podemos nos esquecer de que
somos pobres, não podemos esquecer de que somos negros, mestiços e indígenas;
não podemos apagar da memória o que a história nos engendrou a partir de nossas
lutas, sacrifícios e conquistas em nome da recuperação da humanidade usurpada
por transações escusas e violentas das classes dominantes de nosso país.
Através da
avaliação educacional podemos combater toda fonte de desigualdade que persiste, também,
através de seus efeitos ideológicos nocivos para nós, das classes populares. Não
há, desse modo, nem o/a “estudante-dez”, nem o/a “estudante-zero”, nem uma
hierarquia que se formaria nesse entremeio, partindo dos/as “mais inteligentes”
aos/às “menos inteligentes” identificados/as por uma nota, ou por um conjunto
de notas apenas. Há, como diria Shulman (1986, p.4-14)[1], sujeitos aprendentes, aqueles/as que aprendem
como autores/as de sua própria aprendizagem, em um trabalho coletivo e
participado. Esses/as aprendentes, incluindo-se os/as professores/as, formam,
assim, uma comunidade no qual o conhecimento é compartilhado entre si e com
outras pessoas, grupos, comunidades e instituições, ampliando a cognição,
desenvolvendo raciocínios em múltiplas direções, nas quais os conhecimentos,
saberes e ignorâncias, através de raciocínios reconhecidos e
legitimados pela comunidade de aprendentes que produz identidades unidas por
laços históricos, propiciam o desenvolvimento de inteligências singulares cujas
curiosidades vão se epistemologizando progressivamente no processo educativo.
A avaliação é, portanto, um processo que compõe a aula e que tem sérios desdobramentos políticos e ideológicos, que, por sua vez, podem reforçar um modo de pensar baseado em princípios capitalistas excludentes, ou, por outro lado, pode ser um gesto pedagógico explícito de solidariedade, colaboração e humildade, que cause a ruptura com velhas formas de classificação, selecionamento e hierarquização de estudantes e professores/as em processo de formação humana e profissional.
A avaliação é, portanto, um processo que compõe a aula e que tem sérios desdobramentos políticos e ideológicos, que, por sua vez, podem reforçar um modo de pensar baseado em princípios capitalistas excludentes, ou, por outro lado, pode ser um gesto pedagógico explícito de solidariedade, colaboração e humildade, que cause a ruptura com velhas formas de classificação, selecionamento e hierarquização de estudantes e professores/as em processo de formação humana e profissional.
Joselito da
Nair, do Zé, de Ana Lúcia, da Professora Stela Rodrigues, de Tantas Gentes e de
Jesus, O Emanuel.
[1] SHULMAN. Those Who understand: knowledge, growth in teaching. In Educational Reserch. V. 15, nº 2, 1986.
Traduzindo de modo livre: Aqueles que entendem: conhecimento, crescimento no ensino. In Pesquisa Educacional
Nenhum comentário:
Postar um comentário
joselitojoze@gmail.com