sexta-feira, 20 de janeiro de 2017

MUTIRÃO MULTITIROS

Mutirão já libertou 432 presos em Manaus

Esse “mutirão” ao qual a manchete do jornal A Tarde se refere é o mutirão coordenado pelo Tribunal de Justiça do Amazonas (TJ-AM), iniciado em função do massacre de 56 presos do Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj), “acidente pavoroso” ocorrido no primeiro dia deste ano que promete. Mesmo levando-se em consideração que boa parte desses presos são provisórios – 37% em Manaus e 67% no interior do estado – ainda assim penso que os juízes e demais profissionais envolvidos nessa operação nada entendem de sociologia. Não serão “presos” – esse sujeito imaginário que cometeu algum (ns) delito (s). É preciso saber quem são esses “presos” para que possam voltar a ser “soltos”, porque nesse país, poucos são os “livres”. E isso não é mero jogo de palavras.  
Quando um sujeito é preso nesse país, não importa se roubou a velha e repetida galinha – que deve estar exausta de ser roubada por “ladrão de galinha”, que deve estar cansado de ser assim nomeado, pois não existem mais tantos quintais, nem galinhas neles ciscando para serem roubadas por milhares de “ladrões dessa ave comestível – é atirado no mesmo lugar que assassinos psicopatas, pistoleiros, traficantes, chefes de gangues e facções criminosas. Seu processo fica parado décadas a fio, pois os juízes sempre reclamam que são poucos, mas pouco se vê um juiz trabalhando. O sujeito preso é obrigado, para sobreviver, a entrar numa das facções criminosas, que são as verdadeiras gestoras dos presídios no Brasil. Desse modo, ele passa do mítico “ladrão de galinhas” para o real soldado do crime organizado que comete o terror nas ruas das cidades brasileiras. O filme nacional, “1 Contra Todos” – http://www.foxplaybrasil.com.br/show/13055-1-contra-todos – revela essa face corrupta e decadente do sistema carcerário brasileiro. Portanto, não são presos – esse sujeito generalizado pelo imaginário social – que estão saindo dos presídios e cadeias públicas e privadas, mas membros ativos de facções criminosas que, sabendo de um estado negligente para com sua segurança pessoal e coletiva, continuará obedecendo às ordens dos seus chefes, como forma de continuar sobrevivendo fora das celas e protegendo, o quanto pode, sua família, quando tem. Isso denota que a inteligência por trás de iniciativas como esses mutirões é bem precária.   
Luis Fernando Veríssimo, afirma que o que se pratica no presídio, sob a anuência do estado, é eugenia. Segundo este importante escritor brasileiro:
A eugenia é um bom exemplo, ou um péssimo exemplo, do que ocorre no Brasil há séculos.
Há, por trás do tratamento dado aqui ao negro, ao pardo e ao pobre, cuja amostra mais evidente é esse sistema carcerário ultrajante, um mal disfarçado intuito de purificação.
Empilhar criminosos, independentemente do caráter do crime, em cadeias infectas e esperar que eles se entredevorem é um método prático de depuração. (VERÍSSIMO, 2017, p.A7)
Meus olhos lêem esses acontecimentos através da História. E é pela História que eu vejo escrito nas entradas dos presídios: “Instituição substituta do tronco que ficava no pátio da casa grande, criada especialmente para negros, índios e pardos. Proibida a entrada e permanência de brancos.” E é também pela história que eu vejo escrito nas viaturas policiais e nas atitudes destes para com o que aqui denominamos erroneamente de “cidadãos”: Veículo de transporte de negros fugidos (para as viaturas); Capitães do mato (para soldados, sargentos, tenentes, capitães e coronéis); sujeito suspeito, que deve ser abordado com agressividade (para cidadãos). Quando o “coxinha” do ex-chefe da Secretaria Nacional da Juventude lamentou que não houvesse ainda mais chacinas nas prisões, expressou o pensamento do estado brasileiro e de boa parte da nossa sociedade que, por necessidade ideológica, precisa ocultar a sua verdadeira intenção. Se os nazistas tivessem conhecidos nossos métodos de eugenia, talvez estivessem no poder até hoje.
Portanto, nosso estado não é ineficiente diante do crime organizado que comanda massacres “pavorosos”, acidentalmente ocorridos, segundo o atual presidente golpista. Ele é o próprio crime organizado, que se coloca como extensão do braço armado que pode matar sujeitos indesejáveis pela sociedade branca e elitista, sem precisarem responder por esses crimes contra a humanidade, posto que já são criminosos. O estado não perdeu o poder diante do crime organizado: o crime organizado trabalha para o estado, limpando a sociedade dos negros fugidos que se rebelaram contra as torturas dos capitães do mato de agora. Da mesma forma, a “inteligência” das ações imediatistas do braço jurídico do estado, revela-se uma pantomima, uma cena novelesca de baixa qualidade que busca agradar ao publico e recuperar a “audiência” confiante no final feliz. Não haverá um final feliz. As ruas de Natal, capital do Rio Grande do Norte, já começam a ser incendiadas com as ordens que o tráfico, um dos maiores geradores de riqueza no mundo, está dando para seus soldados fora das masmorras que chamamos de presídios.

Joselito, pardo, sujeito suspeito, com o auxílio de:

VERÍSSIMO, Luís Fernando. Coxinhas. A Tarde, Salvador, p. A7, 19/1/2017.

LASSERRE, Luiz. (Edit/coord.). Intensificadas ações para conter crise. A Tarde, Salvador, p.A4, 18/1/2017

Nenhum comentário:

Postar um comentário

joselitojoze@gmail.com