terça-feira, 10 de janeiro de 2017

O TEMPO NO JORNAL A TARDE: O PASSADO SEMPRE PRESENTE

Ao lermos o conceituado jornal A Tarde e sua Revista Muito, vamos sendo convidados a ler o tempo e sua complexidade. Foi o que me aconteceu ao ler os jornais dos dias 8 e 9/1/2017. Sonhamos em invadir o tempo, contornando o seu avanço. Colocando-nos em qualquer ponto da história em que desejarmos, seja no passado, seja no futuro, seja no presente imediato que emerge daqui a alguns segundos. Segundo Anilton Santos, arquiteto e urbanista,
O presente é uma sombra que ronda o ontem e o amanhã, nisso repousa a nossa esperança e a nossa agonia. O que somos hoje é fruto do que construímos no passado, amanhã seremos fruto do que construímos no presente. (SANTOS, A Tarde, 9/1/2017, p.A2)

Para Santos o tempo tem um fluxo inevitável, como se o passado desembocasse no presente e este, num futuro historicamente inexorável. Pode ser, contudo, que amanhã sejamos passado, não passados para o pretérito, mas passados para o futuro, isto é, na destruição de nosso futuro. Somos passados desde o presente. É o que percebemos nas reflexões da artista visual Gadra Kilomba.
As vezes tenho a impressão de que vivemos numa atemporalidade, em que o passado está sempre no presente. Nós vivemos no presente, mas o passado está sempre sendo construído. E a mudança parece algo muito pontual. O caso Obama, sucedido por Trump, é um exemplo disso. (KILOMBA, Revista Muito, 8/1/2017, p.9)

Essa ideia de que estamos reconstruindo de maneira permanente o passado me parece mais sentida neste momento histórico. Parece-me que a máquina colonial brasileira religou os seus motores e recomeçou a moer a carne humana dos negros, trabalhadores, nordestinos e nortistas, mulheres e homossexuais, conforme charge do criativo Simanca. (A Tarde, 9/1/2017, p.A3)
Somos profetas ao inverso no Brasil: nossas palavras e ações convidam a história a voltar no tempo e avançar para o futuro do pretérito. Em nossas atitudes, iremos para a “casa-grande”, voltaremos para a senzala e pediremos servis aos nossos brancos senhores, a mão para beijar, humilhados perante o poder, a beleza e a força dos nossos brancos, únicos no mundo em perversidade e artimanhas de continuidade de um tempo que se foi.

Nessa máquina do tempo nós ligaremos nossa “contra-redenção”, funcionaremos novamente na mesma condição de paz degradante em que nos encontrávamos num passado sempre presente nas instituições sociais, dos bancos aos hospitais, das escolas às universidades, da família à igreja, realimentando as relações patrimonialistas, racistas, homofóbicas, machistas. Em nossas mãos e em nosso cérebro o passado é reconstruído, dia a dia, na direção do futuro sem futuro. 

Joselito da Nair, do Zé, da Ana Lúcia, do Rafael, de Tantas Gentes e de Jesus, O Emanuel 

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