Neste
momento de nossa história, no qual o Corona Vírus provoca a COVID 19 por todos os continentes deste planeta, levando milhares de pessoas à morte, poderemos
aprender, entre outras tantas coisas, duas coisas fundamentais que se
interligam, para nossa continuidade neste planeta: 1. Se continuarmos nos
comportando como vírus, o próprio planeta Terra vai nos eliminar. Essa ideia
não é minha, é de Leonardo Boff. Não são as pessoas o vírus, mas a ideia que
elas carregam: de transformar tudo em fonte de lucro, levando nosso planeta ao
colapso e desencadeando suas reações emergenciais diante da ameaça humana. 2.
Temos uma nova chance de repensar a humanidade como um só povo, todos moradores
desta nossa casa única. E, ao invés de ficarmos delimitando cada vez mais
fronteiras e erguendo cada vez mais muros, e criando atalhos para mais e mais
guerras, podemos construir cada vez mais pontes, compartilhando nossa moradia
como terráqueos, enfrentando o desafio mais gratificante para nossa conciliação
conosco e com a natureza.
O
capitalismo desencadeia, no mundo inteiro, uma economia devastadora para o
planeta, poluindo rios, mares, desmatando e queimando florestas, extinguindo
milhares de espécies da fauna e da flora – o que abre o caminho para pandemias
sucessivas – e nos aproxima do precipício de nossa autodestruição. É como
lembra Rubem Alves que, citando Guimarães Rosa, afirmava mais ou menos isso: Eu
sou escritor, penso em eternidades, não sou político nem economista, que pensa em
minutos. E acrescenta: feliz quem planta árvores em cuja sombra nunca se
deitará. O economista e o político são lenhadores, destroem para consumo
imediato. Mas fomos criados para sermos jardineiros e cuidar do planeta. O
economista pode ser um economista-jardineiro, bem como o político, trabalhando
na administração dos jardins públicos, da proteção das florestas, dos rios,
cachoeiras, montanhas e mares. Mas um economista que sempre olha para natureza
e vê somente possibilidade de lucro, bem como um político liberal e neoliberal
que administra essa ideia, deixando passar o trator, a motosserra, a serra
elétrica, o lança-chamas, a dinamite, o lixo e a poluição atmosférica, só vai
destruir a beleza que resta, desequilibrando definitivamente nosso planeta e nos
lançando na má sorte da autodestruição.
O
capitalismo nos torna indivíduos virais, que atacam os órgãos do planeta,
destruindo sua proteção e provocando-lhes enfermidades que podem levá-lo à
morte. Cidades que poderiam ser ainda mais lindas, com rios límpidos e margens
arborizadas cortando o seu centro, como Jacobina, Itabuna entre tantas outras
no mundo, tornam-se uma fonte de podridão, pois despejam no rio suas fezes,
seus venenos, suas podridões, revelando o fracassado modelo de desenvolvimento
que impera no lugar. É muito triste e espantoso isso. A gente tem de
desacostumar com isso. Não é natural um rio ser assassinado por nossa carga
viral! Será que não existe saída? Será que não há inteligência suficiente neste
planeta para produzirmos novas culturas na economia e na política que recuperem
o estrago feito neste corpo vivo que é nossa Casa Maior? Não podemos ter uma
economia mais comedida? Para que tantos dinheiros nas mãos de tão poucos? Por
que esse dinheiro não é devolvido para quem o produziu, os trabalhadores e as
trabalhadoras do mundo?
E
ainda temos o grande desafio de nos despir das ideias tolas e perigosas de supremacia branca
anglo-saxônica. Enquanto cada um de nós se achar mais especiais, mais
perfeitos, mais puros e mais santos que os outros povos, sempre estaremos
criando motivos para guerras. Sempre estaremos fazendo apologia às armas como
instrumento de proteção pessoal e de ameaça coletiva, como um pistoleiro do
velho oeste ou “a cavalaria” que matava índios – mulheres, crianças e anciãos
também – pelo domínio de suas prósperas terras. O primeiro filme norte
americano que eu assisti no qual os indígenas foram as vítimas de um massacre
foi “Dança com Lobos”. Antes, todos os brancos eram heróis e vítimas do “ataque
covarde” do índio “selvagem”.
Nossa
humanidade tem de repensar isso! Agora mesmo o que sobrou dos indígenas no
Brasil, está sofrendo ameaças de garimpeiros, "latifudincendiários" e seus
assassinos profissionais, que já mataram algumas lideranças indígenas. Tudo
isso sob a influência desumana de um presidente [BolsoNero] perverso que “governa”, por ora, o nosso país. A violência contra as mulheres disparou, a violência gratuita de
policiais contra jovens da periferia aumentou consideravelmente, o assassinato
de jovens negros favelados disparou e as ameaças virtuais nas redes sociais
ameaçam a cibercultura como espaço de liberdade e de criação coletiva de novos
cenários de esperança e inovação.
Eu
já passei por isso. Achava que era especial, mais especial que as outras
pessoas. Mais especial que meu vizinho, minha namorada, meu irmão, meu colega
de futebol, mais inteligente que meu colega de sala de aula etc. Eu fui infectado por essas ideias. E, se há algo
bom que aprendi é que naquele momento eu era o mais tolo e insensato de
todos/as. E, ao despertar dessa insensatez, dessa babaquice inconsequente, pude
perceber que somente juntos conseguimos ser mais. Não mais que o outro, mas
mais que nós mesmos. E mais, justamente porque sei que não sou mais que
ninguém, muitas vezes até menos, no sentido de que dependo da sabedoria e da
competência alheia para melhorar a minha intervenção na realidade, podendo também contribuir com minha singularidade. Começo
a prestar atenção e a escutar melhor para entender a curiosa lógica de quem
interage comigo. Fico mais observador para contemplar admirado as invenciones
alheias, os saberes que estão em suas diferentes expressões. E começo a deixar
de ver no/a outro/a um potencial inimigo, mas alguém que pode me ajudar a ver
por outros ângulos o que minha limitação ainda não permite. E, no
desenvolvimento desse processo, quem sabe, nossas fronteiras não vão se abrindo
e permitindo capilaridades que potencializam trocas enriquecedoras entre
pessoas, grupos, povos e nações?
Utopia?
Ingenuidade ou possibilidade? Somos destinados à guerra eterna ou podemos
encontrar jeitos de paz? Somos vírus consumindo o planeta, queimando suas
florestas, devorando suas raízes, poluindo seu ar, sua água doce, seu mar, sua terra? Até
quando vamos consumir sem nos preocupar em preservar o que nos é mais sagrado
diante do mistério da vida? Ah. Esse Corona Vírus nos trouxe a oportunidade de
refletir, de nos reencontrar conosco, com quem somos casados, com quem
convivemos mais de perto. Houve muito pedidos de divórcio agora na liberação
controlada da cidade de Wuhan, na China. Será que, quando ficamos juntos, o
pior de nós vem à tona e a pessoa que está ao nosso lado começa a ser eleita
como nossa principal inimiga, e, as guerras do sexo disparam seus canhões e bombas atingindo nossas filhas e nossos filhos? Se não aguentamos nossos/as filhos/as em casa, se
eles também se tornam o inferno, como diria Sartre, que tipo de humanidade nós
temos? Será que não é um egoísmo entranhado que temos o principal motivo que
nos afeta neste momento? De onde vem nossa impaciência com o/a outro/a?
Este,
portanto, é um momento de profunda reflexão que pode nos trazer de volta à
amorosidade, ao afeto, à autocompreensão das ideias que nos controlam, que nos
fazem agir de um modo, sempre previsível, e não de outro. Não é fácil. É preciso muita coragem para isso, para enxergar nossa imagem no reflexo que miramos em nosso interior profundo. Esse é um momento da
gente perceber também que o capitalismo sem a exploração do trabalhador, da
trabalhadora, muitas vezes desumana, não é nada! Suas máquinas, seus dinheiros em formas de papel, suas terras e suas marcas de distinção, não alimentam ninguém. E que a natureza, sem nossa
circulação e atividades destrutivas, respira melhor por um tempo, o tempo que o
vírus ganhou para ela e, talvez, para nós também.
Joselito da
Nair, do Zé, do Rafael, de Ana Lúcia, de Tantas Gentes e de Jesus, O Emanuel