domingo, 14 de agosto de 2011

BANDIDAGEM CULTURAL NACIONAL

Meu país está morrendo, meu Brasil está sendo roubado, invadido, degradado por um punhado de ideias, comportamentos e atitudes nocivas de ladrões, estelionatários e formadores de quadrilha com um grau de cinismo, crueldade e perversão tão agudo que o absurdo está se tornando norma e a honestidade está se tornando cada vez mais rara e surpreendente, de forma deprimente. O nosso mundo está sucumbindo. Exemplos não faltam: padres pedófilos, policiais assassinos, políticos corruptos, guardadores de carro, merendeiras de escolas públicas, gestores desonestos de hospitais públicos, enfim, parece não haver área humana que escape da grande degradação cultural a que estamos imersos. Estamos numa espécie de corrida mortal para a destruição do estado e o pior: a destruição da confiança e da esperança do povo em suas lideranças políticas, pois suas políticas são gestadas nos antros de corrupção que o estado brasileiro abriga e alimenta com sua aberrante impunidade.

O ex-partido da moralidade e da ética foi engolido pelo pragmatismo da “governabilidade”. Oxalá fosse apenas uma questão partidária. Ainda poderíamos ter esperança de que a próxima eleição poderia nos dar a chance de rever nossos erros. Mas o voto não tem mais significação democrática. O voto é uma mercadoria, como qualquer outra. Não há partido que escape do “canto da sereia” do assalto ao cofres públicos e da impunidade que se segue. A degradação está em toda parte. Hoje, na Corrida da Esperança, vimos uma pessoa, que participou da mesma, pegar uma quantidade de copos d’água que não precisava para aliviar sua sede. Colocou tudo dentro de uma sacola e saiu. Essa mentalidade que está presente em muitas pessoas corrói a confiança, destrói a solidariedade e mina a esperança num Brasil eleito pela lei da justiça, do amor e da solidariedade. O próprio processo civilizatório brasileiro está em xeque, podendo ir à mate de uma hora para outra. A instabilidade do sistema é muito grande, podendo desencadear renovações muito positivas do ponto de vista de uma reconstrução dos valores éticos ou, pode também aprofundar e acelerar os processos de degradação que vão nos mergulhar numa barbárie de consequências desastrosas. Aliás, creio que já estamos nessa "corrida maluca".

A esperteza está em todos os lugares e instituições, alimentada e retroalimentada pela díade "otário/esperto". Nos anúncios de jornais e televisos, os automóveis, só para citar mais um exemplo, aparecem em meia página, com ilustrações bem grandes, com seus preços e prestações bem visíveis. Mas as condições vêm com letras tão reduzidas que somente com uma lupa é que dá para ler as armadilhas que os anúncios escondem. As concessionárias pegam o cliente com redes bem feitas de propagandas enganosas, sugando o seu desejo num bem mesquinho como o automóvel. As pessoas não compram um carro, compram uma dívida dividida em prestações longas, pagam dois carros e, quando terminam de pagar, seu carro não vale nem metade do preço original. A propaganda é um exemplo claro, portanto, de nossa cultura da enganação, da falta intencional de clareza, para que o cliente sucumba nos juros altos e nas promoções fajutas. Além disto, os próprios vendedores são orientados a enganar para vender, a levarem o consumidor a acreditar que serão mais felizes com a compra daquele bem, seja uma televisão de lcd, seja uma calcinha comestível, seja um carro novo ou usado, seja um velho político corrupto. 

Mas a felicidade não vem. Vêm as preocupações com o endividamento crescente, com as necessidades cada vez maiores que surgem em função das compras, afinal, ao adquirir um automóvel estamos adquirindo custos fixos como IPVA, abastecimento, lavagem, estacionamento, manutenção. O final de cada mês traz apreensões, tensões que se acumulam, vai nos retirando o tempo e a tranquilidade para nos dedicar à família, aos amigos, ao lazer. O dinheiro que nos sobra vai ficando cada vez menor e o orçamento cada vez mais apertado e a felicidade cada vez mais distante e rara. Os sonhos vão se tornando pesadelo e todo o cenário que foi desenhado artificialmente ao adquirir os bens vai desaparecendo até tornar-se uma lembrança esquecida permanentemente pelo turbilhão de consequências negativas desencadeadas após o evento da compra. Toda propaganda traz, assim, uma felicidade nociva, com um alto grau de corrosão de nosso bem-estar pessoal e coletivo, pois, convenhamos, o que é bom não precisa de propaganda. O que é bom é simples e é assim mesmo. Sempre vai ser assim. "Felicidade é uma cidade pequenina, uma casinha, uma colina, qualquer lugar que se ilumina quando a gente quer amar". A verdadeira felicidade nos habita desde sempre e quando raramente acontece, nos surpreende no momento sublime de nossa suprema realização humana. Eu sei que tem uma sombra de uma árvore num dia quente, e nela uma fruta doce e suculenta. Eu sei que tem uma água cristalina correndo perto dessa árvore e aguardando minha sede. E eu sei que tem uma boa nova me aguardando em tempo oportuno. Tem felicidades me aguardando a qualquer tempo para que eu prove um pouco do segredo de Deus que habita o cosmos imenso e talvez infinito onde estou inserido. Eu não preciso comprar coisas repetidas para sentir alegria. Raul Seixas estava certíssimo em seu "Ouro de tolo".

A bandidagem está em nossas entranhas sociais e culturais, alimentada e retroalimentada em cada pequeno gesto, em cada intenção de se dar bem frente ao outro. De levar pra casa pequenas coisas, de levar pra dentro de si pequenas corrupções que nos escravizam nesse modus operandi de viver em sociedade à custa do otário, que deve ser esperto diante de outro otário que bem pode ser a gente em outro momento. E o ciclo vicioso vai seguindo seu destino de degredo, forjando personalidades cada vez mais mesquinhas e interesseiras, baseadas na troca, na mercadoria que realize o desejo doentio de ter sempre mais para, quem sabe, tentar ser o que nunca será, pois preciso voltar a Parmênides para lembrar que "o que é, é" e, articulando a Paulo Freire, acrescento que o que é, mesmo quando deixa de ser, é para ser mais, mais com outro, que é o único jeito da gente ser mais sem ser menos, apenas diferente. Cancão de Fogo e Pedro Malazartes são nossos exemplos inconfessáveis de cidadania e de ética. Nossos heróis, caro Cazuza, não morreram de overdose. Estão bem vivos. Engordaram, compraram mansões, aumentaram seu patrimônio centenas de vezes e ocupam cargos estratégicos nas entranhas do estado, fazendo da República um antro de marginais à custa dos otários/espertos que aguardam as obras e as políticas que, se chegam, não interessam mais a quem não espera mais por nada.

Joselito da Nair, do Zé, do Rafael, de Ana Lúcia, de Tantas Gentes e de Jesus, O Emanuel

Um comentário:

  1. Isso aqui, ô, ô, é um pouquinho de Brasil, iá, iá... Desse Brasil que canta e é (in) feliz. Um povo que vive apesar de... Não ter saúde, educação, alimentação, moradia, de ter apenas o direito de ter direitos que não são respeitados!
    É preciso que apontemos o dedo para essa imensa ferida, que nunca cicatriza! Continue fazendo isso... Você é um dos poucos que ainda se importa!

    Abraço!

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