segunda-feira, 31 de dezembro de 2012


Tudo é fruto do chão,
de onde brota a tristeza,
a esperança e a revolução.

Tudo nasce da terra:
morada da raiz,
lugar da enxada
e do pensamento.

Do chão nasce o homem
e o lobisomem;
nasce o anjo e a fera.

Nasce o uivo, o assobio,
o amor, a lascívia,
o grito, o choro e o cio.

Nasce a bela.

É na terra que o herói
se revela
e também amarela.

E do pó que levanta
do chão
verifica a sua existência

E conclui que à terra retorna
exercício forçoso
de Sapiência.

Joselito da Nair, do Zé, do Rafael de Ana Lúcia, de Tantas Gentes e de Jesus, O Emanuel. Na esperança de retornar do pó para a vida eterna.

quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Procura-se emprego no âmago do seu segredo

Deixou-lhe o meu currículo em suas mãos. 
Deixo preciosa informação:
a de que fiz muito pouco, 
a de que sou homem fraco e perdido. 
Não procuro emprego, procuro abrigo. 

Procuro comigo meu rumo no mundo, 
pra viver quem serei, 
se serei depois de agora.
E não quero nem sei.  
Quero viver o meu ser 
sendo, seio, peito, mama. 

Fase oral. 
Não. Não jogo pedra na Geni tália. 
dói bastante essa batalha.
Passo lábia.
Meu prazer não basta. 
Seu prazer me abasta
e me acalma.

Joselito M. de Jesus

segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

VIVA SÃO JOÃO!!!

O cara que saiu anunciando a boa nova da história humana, deve ter sido tomado de uma esperança concreta e de uma alegria incomensurável que poucos seres humanos jamais tenham experimentado. Além dele incluindo-se José, Maria, Seus pais e os poucos que adentravam aquele advento, aquela espera original na história humana. Estava nascendo o ser mais magnífico da aventura humana: Deus estava nos visitando em carne e osso!!!

E não era uma visita comum, daquelas ligeiras nas quais a gente chega e toma apenas um cafezinho e retorna. Na verdade não era nem uma visita propriamente. Era uma missão especial. Uma missão de resgate, de perdão, de justiça, de compaixão e de amor, sobretudo de amor. Nós, que mesmo na contemporaneidade, parecemos sucumbir em nossas mazelas, em nossos atrasos, enfim, em nossas “desgracenças”, sonhamos com um mundo diferente, que parece cada vez mais distante do Reino de Deus. É exatamente por isso que precisamos de muita fé, de muita força, da simbolização forte do céu sobre nossa história. Deus chega como uma criança e dá início a toda uma pedagogia encarnada na história, no contexto de produção de significados das mulheres e dos homens do seu tempo e do seu lugar, para fazer entender o fabuloso e o sublime, a mística do céu, através da cultura humana, localizada geograficamente. 

Eu fico imaginando a sensação de João Batista nesse contexto. Estava chegando, na verdade nascendo, a pessoa que iria mudar para sempre a história do mundo, que daria A Chance de escolhermos o caminho a seguir dali para frente. Um caminho da fraternidade, da reconciliação com Deus, com os seres humanos e com a natureza e o outro, o caminho de sempre, do atropelo de tudo o que impede os nossos interesses mesquinhos de serem realizados. João deve ter sido tomado de uma alegria única, uma felicidade real que se concretizava em seu tempo. Uma luz começou a brilhar intensamente desde o nosso humilde planeta. A Grande Vida acendia o seu fulgor bem aqui. E o melhor: a partir dos mais humildes e dos esquecidos pela sociedade. Todos aqueles que sofriam a amargura do esquecimento e do abandono, todos aqueles e todas aquelas que eram esmagados por um sistema "politiqueiramente" religioso de silenciar, de excluir e de punir, começaram a ver seus sonhos concretizados num Deus que abre mão de seu poder infinito e se oferece como cordeiro para ser sacrificado em nome de coisas valorizadas nas palavras e desvalorizadas na ação: amor, e obediência. E João envolveu-se nessa aventura com paixão. Imitou Deus. Andava simplesmente e suas palavras e ações preparavam o terreno para Aquele Maior que estava chegando, não triunfalmente, como um poderoso rei, mas como um simples ser humano que nasce numa manjedoura, fugindo da espada infanticida de Herodes.

João Batista, como te admiro e te invejo. Você mesmo se entregou. Coerentemente deu a vida em nome de seus valores e sua fé. Deve ter sido a alegria de viver num tempo em que a renovação de tudo chegou à história. E hoje essa luz, simbolicamente, está prestes a brilhar com mais intensidade na vida de todos e de cada pessoa em particular. Por mais escuridão, incerteza e insanidade que a gente perceba no mundo contemporâneo, sei, com João Batista, que Deus não nos abandonou. E “Eis que faço nova todas as coisas”!!!

No novo mundo os humilhados serão exaltados; o juízo será guiado pela leveza, porque o fardo Dele é leve e seu jugo é suave. E nem a morte será mais motivo de desesperança, porque a ressurreição é chegada com a presença magnífica e milagrosa da Vida. E João Batista acreditou nisso tudo e muito mais com antecedência. E João viveu essa alegria de ver a humanidade ter a possibilidade de mudar, para sempre, o seu destino rumo à vida, à justiça e ao amor. Viva São João!!! Mesmo que seja em pleno Natal.

Joselito de São João e do Menino que nasceu pra todas as gentes. 

quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

A ESTRADA QUE ATRAVESSA O CAMINHO DAS BORBOLETAS


Esses últimos dias dirigi bastante. Fui à Baixa Grande, voltei para Jacobina, fui à Quixabeira e, de lá, voltei para Salvador. Eu gosto de dirigir. Enquanto trafego por estradas que parecem não ter fim, fico contemplando a paisagem. Uma das coisas que mais gosto é observar as casas avarandadas que me observam passar velozmente. Elas sempre estão ali vigilantes, testemunhando a procissão veloz que, à distância, parece lenta.

Sinto uma imensa vontade de dirigir-me até lá. Para ficar um pouco naquele lugar de vigia. Pedir um copo d’água fresca como desculpa e sentar no chão frio de cimento, para ficar dali registrando o mundo ir e voltar, no círculo de costume que ele faz pra viver, como a trilha cotidiana das formigas construindo a vida. De fato, olhando dali, eu também sou uma formiga. Nada mais que uma formiga, que sobe e desce, vai e volta, circula constantemente a construção que a existência exige. Mas eu continuo. Estou preso no destino que escolhi momentaneamente. E eu mesmo sou o mundo que vai e volta para continuar vivendo como eu quero. Embora a estrada pareça reta, sei claramente que estou traçando um círculo ou uma elipse em minha vida.

Este círculo ou esta elipse que traço deve ter um centro em torno do qual giro. Deve ter. E é por isso mesmo que investigo a minha subjetividade que também trafega, para ver se consigo encontrar o meu sol, ou os meus sóis e minhas luas, astros em torno dos quais desenvolvo as minhas quatro estações. E dirijo, absorto em pensamentos que me acompanham estrada adentro ou afora, numa velocidade espantosa.

Pensamentos que me afligem
sentimentos que me dizem
dos motivos escondidos
na razão de estar aqui.
As perguntas que me faço
são levadas ao espaço
e de lá eu tenho todas
as respostas que pedi...

Assim como o velho rei Roberto Carlos, Sempre procuro Deus para conversar. Mas evito as religiões e os religiosos profissionais. Como a maioria deles procura evitar artificialmente o mundo, eu procuro evitá-los concretamente. Porque eu sou mundo. E dirijo, rezando pra ver se consigo alcançar equilíbrio no giro que traço na vida em que existo.

E foi vindo de Baixa Grande para Jacobina, passando por Mundo Novo e sua paisagem belíssima, e depois, voltando de Quixabeira para Salvador, que deparei-me com o título deste texto. Estou muito sensível. E havia um tráfego intenso cortando a estrada: o de borboletas. E percebi o quanto estava matando no choque entre o ferro veloz e impiedoso, pintado de prata, e a asa frágil colorida pela vida. Então, movido por Beto Guedes – “Tudo que move é sagrado e remove as montanhas com todo o cuidado...” – comecei a desviar das asas frágeis que batiam em busca da outra margem da estrada. E fiquei pensando no porquê das borboletas atravessarem a estrada. Algum biólogo especializado nas asas frágeis deve saber. Vi muitas debatendo seus últimos suspiros no asfalto estendido no chão. Seu voo interrompido pela velocidade brusca dos humanos atrasados. Os humanos estão muito atrasados.

Mas, outro pensamento assaltou-me: percebi que não eram as borboletas que cortavam a estrava, mas, ao contrário, era a estrada que cortava o caminho das borboletas. Como os humanos estão atrasados, eles chegaram depois das borboletas e, como elas são muito frágeis, os humanos não conseguem perceber fragilidades e, por isso mesmo, colocaram a estrada ali, sem consultar as borboletas e seu trajeto magnífico. Foi aí que me senti ainda mais insensível. E foi por isso que comecei a tentar desviar das criaturas aladas cujo caminho eu invadia com a crueldade veloz de ferro, plástico, óleo, combustível e borracha. Pensei ainda em parar o carro, sei lá. Ficar no acostamento contemplando a procissão sagrada que a estrada atravessava. Mas continuei, rezando por elas e agradecendo a sua existência poderosa e frágil.

Vamos colocando nossas estradas por aí, nossas barragens acolá, nossos edifícios ali e nossas piscinas alá, sem pensar nos pequenos seres da vida que precisam existir, para nós continuarmos existindo. As asas no seu trajeto conduziam a vida à vida diante dos meus olhos. Vida batendo delicadas asas, enviando informações mais adiante de que a vida continua e se transforma. A estrada já está ali há algum tempo e não sai dali tão cedo. Continua atravessando a vida. O ser humano, atrasado e arrogante, pensa que está construindo estradas e permitindo o desenvolvimento. Hum. No dia em que o ser humano inventar uma máquina que triture capim de um lado e dê leite pelo outro eu vou comemorar e beber à genialidade humana. A natureza já se antecipou: nos deu a vaca. O desenvolvimento já foi dado pela vida, pela forma como a natureza nos doou este lugar, com lagos, com rios e mares, com árvores e frutos, com montanhas e geleiras, enfim, com fauna, flora, e tudo que aflora, inclusive as borboletas frágeis que invadem os meus olhos e me contam segredos da vida que voa sua arte delicada de cor e leveza.

Joselito da Nair, do Zé, do Rafael, de Ana Lúcia, das borboletas, de Tantas Gentes e de Jesus, O Emanuel. 

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Encanto


Encanto não se explica
a gente fica sem saber o quê
e quanto mais procura explicação
mais ela procura se esconder

Encanto não tem tempo de manifestar
É tanto que eu não entendo
como fica um tanto
sem a gente notar.

Mas quando acontece
sem previsão
tudo fica claro
como um raio.

A gente não sabe:
sente,
vive.
E isso é mais que suficiente!

Encanto paralisa no espanto.
De repente é que acontece
como um presente
para quem não merece.

Encanto acontece
quando estamos distraídos
não há placa, nem aviso.
Quando estamos em linha reta
e a chegada é coisa certa
aparece o improviso.

E, depois desse momento,
fico um tempo atônito
sem saber mais o destino,
O mapa perde suas referências
após o incidente atômico.

Surgem estradas do nada
o asfalto vira água.
Sem bússola, olho pro céu
para ver se reencontro
o meu novo trajeto
que o encanto refez.

Joselito de Jesus

quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

VIRA-LATAS


Vira-latas cães vadios
passeiam pelo mundo
entre a fome, a alegria e o cio.

Vira-latas, viram mundo
com um olhar de “dom pixote”
apelam contra o açoite
e vivem a favor da sorte.

Vira-latas não têm raça.
São como os brasileiros:
Macunaímas sem caráter
O seu rabo manifesta
toda festa pro seu dono
como uma devoção
a presença da alegria
bem em frente ao portão.

Basta um osso velho
para roer
basta uma lata
para virar
basta-lhe uma poça
para beber
basta um dono 
pra cuidar (sem compromisso)
basta-lhe o resto
para comer.

Eu também sou vira-latas
procuro meu osso por esse mundo
cavando em quintais
uivando pra lua.
Tenho uma dona
que não me bota coleira
E, quando no cio,
sou cão vadio
vivo a uivar:
Auuuuuuuuuuu!!!!

Joselito da Nair, do Zé, do Rafael, de Minha DonAna, de Tantas Gentes e de Jesus, O Emanuel

domingo, 2 de dezembro de 2012

É Segredo

Segredo não conte
o segredo guardado
eu amo e amo
mas não posso dizer
meu segredo
Não sei bem nem dizer
nem pra mim
mas eu amo e amo
e é bem assim.
 
Sentimento que revela
seu segredo
perde o encanto
vence o medo.

O segredo do risco
que há em todo o sentimento
não impede sua impetuosidade.
Não importa a verdade
me atiro no segredo
de sentir a vida inteira
que está nesse momento
de atirar-me de cabeça
em meu supremo sentimento.
É segredo.
Joselito da Ana Lúcia

Procuro a palavra

Procuro palavras para brincar
Palavras coloridas e plenas de vida
Procuro palavras de céu, gaivota e mar.
Palavras de gozo, de arte,
Palavras para navegar
pela existência.


Procuro o endereço
o caminho do discurso
o curso do dito.
Procuro a trilha deixada
pelos já-ditos.
 
Estudo o provérbio
e o verbo inclinado,
averiguo os sentidos
e procuro encontrar
nos vestígios deixados
a pronúncia da vida.
 
A pronúncia exata é dita
nos vãos do silêncio
nos gritos, olhares,
naquilo que não sabemos bem
mas ficam nos ares.
 
Procuro palavras inchadas
palavras feridas,
abandonadas pela história.
Garimpo os sentidos
deixados
para ver se entendo
num futuro não dito
a pronúncia do presente
e o já-dito do passado.  

Procuro dizer a palavra
da lavra humana
que salva o sentido
de tudo na vida.
Procuro a palavra do dia,
o verbo do ano.
Procuro no fundo
de todo o sentido
 a palavra para dizer
que te amo.

Joselito da Nair, do Zé, do Rafael, de Ana lúcia, de Tantos ditos e de Jesus, O Emanuel

quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Noite Adentro


Nem imaginava que a minha noite
retornaria
para passar da meia noite
para o outro dia.

Eu era noite
e uma noite dentro dela
improvável e inesperada
conduziu-me noite adentro
no sentido da alvorada.

Estava à noite
tateando algum sentido
desfiando a esperança
caminhando amedrontado
pelo indiviso.

Só havia noite e,
dentro dela,
uma outra noite  me acolheu.
Breu dentro do breu
Noite negra e surpreendente
noite de fé e de sarça ardente
me amanheceu.

A noite dentro da noite
na noite em que eu estava
Só havia noite e mais nada.
E, nessa noite tão obscura
na mesma noite
estava uma sem ser escura.
Tinha um brilho sem ser a luz
tinha um encanto sem ser magia
que mudou a minha noite
da noite para o dia.

Quando eu pensava que
tudo havia anoitecido
Quando eu estava com
meu sentimento escurecido
eis que o crepúsculo
trouxe-me a noite
que eu jamais havia esquecido.

Joselito da Noite dentro da noite

segunda-feira, 26 de novembro de 2012

NECESSIDADE E INTERESSE

Tenho interesse em  viver.
Preciso me entender
ajeitar minhas crenças
aceitar o meu jeito
com virtudes e defeitos

Tenho interesse em amar,
em sentir o intenso de outra pessoa
Tenho interesse em cuidar
e lembrar na ausência
penetrar a memória
e encontrar a presença.
 
 Tenho interesse em saber.
Cultivar a curiosidade
com vontade de infância
com vigor juvenil
e paciência senil.
 
Tenho interesse no sol e na chuva,
na relva e no vento
no rio e no lago
no mar e depois do horizonte.
 
Tenho interesse na caatinga
e na mata atlântica.
Tenho interesse em forró
e chamego
Tenho interesse em proteger
a Amazônia e a onça pintada.
 
Tenho interesse em amar
em viver, em saber
em proteger e, para isso,
tenho que me entender.
 
Joselito da Nair, do Zé, do Rafael, de Ana Lúcia, de Tantas Gentes e de Jesus, O Emanuel