E lá vem o Papa com a
"jornada mundial da juventude..." Será que é a mesma juventude indignada
e aguerrida que está nas ruas? Será que o Papa falará sobre corrupção, IDH
baixo dos brasileiros, impunidade, as leis frouxas do país, extorsão da
população brasileira pelo estado através dos impostos? Falará sobre justiça e
injustiça? Falará sobre o papel político e ideológico da juventude no mundo
contemporâneo? Será que o Papa falará sobre a destruição do meio ambiente no
Brasil? Será que vai falar sobre o amordaçamento do Ministério Público? Será?
Ou será que Ele vai preferir não se comprometer com as “otoridades” brasileiras
e vai falar sobre os mesmos temas generalistas de fé – desencarnada da vida -,
resignação diante do sofrimento, salvação – após a morte -, sexo antes do
casamento, homossexualismo, drogas, etc. Sobre o que o Papa vai falar? Sobre o
que o Papa não vai falar? Sua palavra e seu silêncio terá impacto em nossa
recepção política e ideológica? A vinda do Papa ao Brasil, é baseada em que
análises católicas? É devido à perda de fiéis, não tão fiéis assim?
Do mesmo modo, o que os
jovens católicos irão discutir? Quais são os temas que irão abordar e quais são
os problemas que irão enfatizar? Irão fingir que não estão em nosso país e vão
abordar temas alheios à nossa efervescência política? Vão conseguir retomar a
ligação entre fé e vida? Entre céu e terra, entre Deus e os seres humanos? Será que nossos e nossas jovens aprenderam
a rezar o Pai Nosso? É. Leonardo Boff quem me ensinou. A primeira parte da
oração diz respeito às coisas de Deus: O
Pai, a santificação do Seu Nome
e a satisfação de Sua vontade. Depois
as coisas humanas, que Deus mesmo reconhece como legítimas, apesar de muitas
igrejas católicas e evangélicas não reconhecerem: o pão, necessário à nossa sobrevivência – entenda-se o salário
decente, o transporte público de qualidade, a educação necessária para nossa
formação e profissionalização, o acesso a um sistema de saúde eficiente e
eficaz, etc. – o perdão fundamental,
pois, precisamos nos perdoar, perdoar o outro e ser perdoados para sermos
felizes; a força divina contra as
tentações – a tentação de roubar utilizar o público para fins privados, a
tentação de trair nossos colegas por “30 moedas de ouro”, a tentação de ficar
em casa na frente do sofá assistindo a Globo, vendo a história passar diante
dos nossos olhos, etc. – e a proteção
maior contra o mal, para não sucumbirmos definitivamente num país cheio de
violências que tiram milhares de vidas todos os anos, na maioria vidas de
jovens negros das periferias desse país.
Rezar o Pai Nosso é se
comprometer com a vida, com a história, com a justiça concreta, com tudo o que
ocorre em nosso âmbito territorial nesse momento em que se desenrola a nossa
existência. Deus é um Deus Vivo! Não um ser que fica distanciado do mundo
curtindo nosso sofrimento. Deus assume a nossa condição humana e sofre conosco.
Da mesma forma Deus nos dá forças para a luta. Deus não fala que devemos ficar
parados e aceitar, tal como ovelhas inocentes, resignadamente o sofrimento.
Deus nos incita a reagir e fica, tão surpreso quanto nós mesmos, com o jeito
como a História irrompe forte a sua força juvenil em busca do amor e da justiça.
Deus é um Deus Conosco: um Emanuel. Deus marcha conosco! Não apenas o deus de
uma religião. Mas Deus, O dos evangélicos, O do Candomblé, O dos católicos,
todos e todas são Deus, experiência viva de todo ser humano que cultiva a
transcendência, dialeticamente. Deus que não seleciona, mas acolhe a todos e a
todas em seu seio.
E por falar em seleção: Nosso
país tem muitas seleções. Não apenas a de futebol. Temos a seleção dos jovens
que serão mortos este ano pelo tráfico e pelas polícias. Serão, na maioria
negros e pobres da periferia das cidades; temos a seleção dos que morrerão,
ainda este ano, em filas de UTI de hospitais dos grandes centros urbanos.
Pessoas pobres das cidades, com poucos recursos políticos, sobrevivendo tanto
na pobreza econômica quanto na pobreza política; Temos também a seleção dos que
morrerão, ainda este ano também, na violência do trânsito. Ciclistas,
motoqueiros, anciãos, crianças, operários que andam a pé pela cidade, jovens em
busca de destino. Outra seleção serão as pessoas que morrerão vítima de balas
perdidas, de assaltos à mão armada, de sequestros em shopping e em bancos, ou
mesmo nas explosões periódicas de bancos no estado. Temos a seleção de
semianalfabetos deste ano. Aqueles e aquelas que não dispõem de um bom
professor, uma boa professora para lhes orientar de forma competente no domínio
da língua portuguesa. Mas a seleção maior deste país é a dos indignados com
tanta mazela, com tanta impunidade, com tanta corrupção, como tanto cinismo e
descaramento desses políticos vagabundos que temos. E Deus, pelo menos o Deus
em que acredito, não concorda com essas seleções. Mas será que o Papa vai falar dessas
coisas?
Joselito da Nair, do Zé, do
Rafael, de Ana Lúcia, de meus alunos da UNEB, de Salvador, de Jacobina, da
Bahia e do Brasil, de Tantas Gentes e de Jesus, O Emanuel
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