sexta-feira, 21 de maio de 2010

Sobre Professores

Segundo Carlos Rodrigues Brandão – como já me referi neste espaço – não existe apenas uma educação: a melhor, a mais apropriada, a “superior”. Educações é o termo mais apropriado para explicar os múltiplos e diferentes processos educativos em diferentes situações, circunstâncias e modelos culturais. Desde que nasce, o surumano, melhor, o ser humano, começa um processo de diferenciação que o vai tornando um membro da civilização a qual pertence. Vai afastando-se dos demais animais e da natureza e se aproximando da fina flor da humanidade, em parte dos casos, é claro, como o bem demonstra as situações empíricas. Dentre todos os animais, a espécie homo sapiens sapiens é a que mais demora para ganhar determinada autonomia a partir do momento em que nasce. Sem um processo educativo, por mais rudimentar que seja, esta espécie não sobreviveria muito tempo.

Não foram músculos e garras que tornaram o sapiens sapiens dominante, foi a inteligência abstrata. Se os leões e os orangotangos tivessem um pouquinho de pensamento abstrato nós seríamos meros estoques de carne ou escravos de tais poderosos animais, aliás, o filme Planeta dos Macacos sinaliza isto. É justamente por isso que a educação é fundante no processo de humanização e preservação da espécie. Desde a educação informal e assistemática que se dá nos vários processos sociais, das relações familiares às de vizinhança, até a mais sofisticada pós-graduação nas universidades mais respeitadas do mundo. É preciso, contudo, ressaltar que vivemos num mundo contemporâneo que não prescinde da formação sistemática e formal que se dá nas instituições públicas e privadas de ensino. Sem esta, o sujeito vai ter sérios problemas para inserir-se nos complexos processos sociais do nosso tempo cada vez mais digital. Claro, sempre haverá espaço para o trabalho braçal. Porém, esse espaço vai sendo reduzido cada vez mais pelas impressionantes novas tecnologias criadas e desenvolvidas pela humanidade. Ontem vi um reportagem sobre os tratores que estão sendo comercializados para o trabalho agrícola. Parecem naves espaciais e fazem mil coisas, superando o trabalho braçal e exigindo que o trabalhador se prepare para seu uso eficaz e eficiente. Sem um processo formativo orientado e sistemático, inclusive para o indivíduo aprender a ler, decodificar e interpretar símbolos que os painéis digitais exibem, fica uma tarefa “difícil, dificílima”, sua operacionalização adequada.

E quem vai formar esse esperado sujeito exigido por esse "admirável mundo novo"? É o professor. Este último entra no processo econômico, social e cultural numa posição estratégica. O professor faz parte dessa dinâmica complexa e é responsável por mediar o surgimento desse ser humano com as habilidades, comportamento, valores e crenças, modos de agir e de fazer contemporâneo. É o professor quem vai planejar os processos, a partir de avaliações diagnósticas adequadas, preparando os educandos para responder satisfatoriamente aos desafios ecológicos, tecnológicos, políticos, culturais e sociais do seu tempo. A educação sistemática, intencional e formal é a arte de transformar um sapiens sapiens num ser humano. É o que Vygotsky chama de passagem do biológico para o sócio-histórico. E quem está provocando, dirigindo, orientando, mediando esta passagem: o professor, o educador. Daí a importância crucial para a humanidade desse profissional da educação. Do professor depende a continuidade cultural, econômica, social e antropológica da civilização. Por mais que haja críticas ao corpo docente, por mais que haja dificuldades e problemas de ordens diversas, ninguém tem condições de afirmar que o professor é prescindível. Só existe uma sociedade porque houve e há processos educativos que nos permitiram chegar a esse ponto. E quando a gente vai fazer uma arqueologia do saber, ou uma simples investigação histórica, o professor, a professora, aparece na cena tecendo, esperançosamente, os fios do seu povo, da sua gente. Uma sociedade que despreza, desvaloriza, esquece seus educadores, está fadada a retornar aos estágios mais baixos de seu processo civilizatório e se perder no tempo.

Inegavelmente, Seu José Benedito e o professor Ático exercem um papel simbólico e prático da mais alta relevância social e cultural em Macaúbas, além de tantos outros que não conheço, dos tantos e das tantas que desenvolvem seu trabalho discreta e pacientemente em cada sala de aula, em cada espaço pedagógico que aparece quando duas pessoas ensinam e aprendem num processo interativo salutar. Educar é uma tarefa preciosa. De um ser, dado em sua filogênese, nos marcos hereditários de sua espécie, nasce um segundo ser, o humano, num segundo parto, cuja maternidade é a escola, e cuja parteiro(a) é a professora, o professor. Para desenvolver satisfatoriamente seu papel, tal profissional da educação necessita estar bem, sentir-se valorizado pela sociedade a qual pertence, ganhar um salário decente, que lhe permita participar de encontros em sua área, comprar livros, fazer sua pós-graduação, entre outras. Inclusive cuidar de si mesmo(a), tendo um salário que lhe permita viajar, cuidar da saúde, ter uma casa confortável – conforto não significa luxo, alimentar-se bem, ir a um teatro, cinema, entre outras necessidades, afinal, como cantam os Titãs, “a gente não quer só comida, a gente quer bebida diversão e arte”.

Entretanto, as políticas públicas e o sistema educacional atual são feitos para espantar jovens promissores, futuros educadores que poderiam dar excelentes contribuições na área. Não está valendo a pena ser professor nos dias atuais, nem da rede pública, nem da privada. Ser professor é ser bem pobre. É não ter livros – que paradoxo!; é ficar sempre devendo ao final do mês, é, como afirma João Cabral de Melo Neto, “[...]Tentar despertar algum roçado das cinzas”. Os jovens fogem da sala de aula, pois, inteligentes que são, sabem que esse espaço está abandonado pela sociedade, sabe que os atores desse espaço são tratados a pão e água pelos governos nas diferentes esferas de poder, pois é melhor juntar três ou quatro e elaborar uns axé’s dançantes, como são conhecidos, que debruçar-se sobre livros e seres a serem humanos, a fim de produzir sua existência.

Joselito da Nair, do Zé, do Rafael, de Ana Lúcia, de Tantas Gentes e de Jesus, O Emanuel.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

joselitojoze@gmail.com