Uma vez o renomado sociólogo brasileiro Florestan Fernandes fez uma pergunta que me deixou com vertigem. Como pode existir uma universidade democrática numa sociedade autoritária? Ainda era estudante de graduação do curso de Pedagogia da Universidade Católica do Salvador. Fiquei atônito mesmo, pois minha imagem primitiva de universidade era de uma instituição onde se podia discutir sobre todos os assuntos possíveis dentro do rigor acadêmico necessário. Ainda há pouco tempo não encontrava a resposta para a pergunta de Florestan Fernandes, até que descobri que respostas como essa a gente só encontra no passar pela democracia ou pelo autoritarismo da experiência, ou seja: pela práxis social contextualizada, e não apenas na busca de compreensão intelectual abstrata.
Eu tenho paixão por escrever. Acredito que a escrita é uma das formas de comunicação que, para além da verbalização, nos envia reflexivamente de volta a nós mesmos, pois o texto circula e retorna, não mais o mesmo texto, mas inserido do com-texto. O autor então não é apenas o autor, mas o co-autor, porque o texto não circula imune. Ele retorna “imundo”, ou melhor, cheio de mundo a nos interpelar. O texto vai perdendo, forçosamente, sua abstração e sendo reinscrito pelo mundo em que circula, trazendo de volta o concreto dialógico a desafiar seu autor. Eu me sinto assim, desafiado pelos meus textos que circulam, instado permanentemente a pensar com mais rigor, com mais coerência, com mais sapiência, com mais saber e, como sinto, com mais sabor, mesmo que às vezes o gosto seja amargo. A escrita é exercício de prazer e liberdade. Ninguém pode garantir essa liberdade. Mas, desconfio, que a universidade talvez só autorize os escritos dos já conhecidos, dos já mapeados, dos já ca-das-trados. Eu ainda não fui cadastrado e espero nunca sê-lo, deve doer pacas. Vou escrevendo sem cadastro mesmo. Não se pode escrever apenas concordando, não se pode escrever apenas elogiando, não se pode escrever sem acreditar, nem bajulando. Não se deve escrever aceitando intimidações e mudando o significado dos textos. Também não se deve escrever sem o devido cuidado ético, criticando apenas por gosto de destruir o outro. Senão a escrita perde sua força ética e estética, seu conteúdo crítico e sua capacidade acadêmica e política.
O conhecimento, a reflexão, a aprendizagem coletiva é algo fantástico, apaixonante, solidária e contraditória. A Universidade acontece em sua rotina dinâmica, que ainda não é dialética porque ainda não é democrática, mas vai sendo nos espaços criados pela ousadia do pensar, que é dizer a sua palavra.
A estrutura universitária tem seus fundamentos – comumente o pedreiro chama, na construção civil, pelo sugestivo nome de “sapata” – no colonialismo atrasado que nos fundou baseado na herança patrimonialista portuguesa. Herdamos a “sapata portuguesa” e ainda insistimos em caminhar com ela, pois assim caminha a humanidade brasileira nesse meio milênio de des-cobrimento. Necessitamos tanto da intimidação, da ameaça, do uso de recursos autoritários de poder que não sabemos como agir em situações simples que interpretamos como ameaça. Para surpresa das gerações mais novas de nosso “gigante pela própria natureza” ainda somos coronelistas, ainda somos racistas e escravocratas, ainda somos machistas, ainda somos nepotistas, ainda somos clientelistas. Quanto mais idade me chega mais começo a desconfiar que os políticos que dizem nos representar, afinal nos representam. O Congresso Nacional tem uma face bem baiana e brasileira e a universidade baiana não está imune a tudo isto. Talvez ainda interpretemos “estabelecer limites” com “impor censuras”; talvez ainda signifiquemos “cobrar responsabilidades” com “desautorizar autorias”; talvez ainda interpretemos “vencer o oponente” com “eliminá-lo completamente”. Com essas heranças que se reestruturam também na universidade não podemos sonhar coisas de falar e escrever, coisas de defender com paixão, coisas de se acreditar e fazer, coisas de pesquisar com liberdade, porque essas coisas não se voltam para nós, dialeticamente, mas se voltam contra nós, autoritariamente.
Eu tenho paixão por escrever. Acredito que a escrita é uma das formas de comunicação que, para além da verbalização, nos envia reflexivamente de volta a nós mesmos, pois o texto circula e retorna, não mais o mesmo texto, mas inserido do com-texto. O autor então não é apenas o autor, mas o co-autor, porque o texto não circula imune. Ele retorna “imundo”, ou melhor, cheio de mundo a nos interpelar. O texto vai perdendo, forçosamente, sua abstração e sendo reinscrito pelo mundo em que circula, trazendo de volta o concreto dialógico a desafiar seu autor. Eu me sinto assim, desafiado pelos meus textos que circulam, instado permanentemente a pensar com mais rigor, com mais coerência, com mais sapiência, com mais saber e, como sinto, com mais sabor, mesmo que às vezes o gosto seja amargo. A escrita é exercício de prazer e liberdade. Ninguém pode garantir essa liberdade. Mas, desconfio, que a universidade talvez só autorize os escritos dos já conhecidos, dos já mapeados, dos já ca-das-trados. Eu ainda não fui cadastrado e espero nunca sê-lo, deve doer pacas. Vou escrevendo sem cadastro mesmo. Não se pode escrever apenas concordando, não se pode escrever apenas elogiando, não se pode escrever sem acreditar, nem bajulando. Não se deve escrever aceitando intimidações e mudando o significado dos textos. Também não se deve escrever sem o devido cuidado ético, criticando apenas por gosto de destruir o outro. Senão a escrita perde sua força ética e estética, seu conteúdo crítico e sua capacidade acadêmica e política.
O conhecimento, a reflexão, a aprendizagem coletiva é algo fantástico, apaixonante, solidária e contraditória. A Universidade acontece em sua rotina dinâmica, que ainda não é dialética porque ainda não é democrática, mas vai sendo nos espaços criados pela ousadia do pensar, que é dizer a sua palavra.
Autoria: Joselito do Zé, da Nair, de Rafael, De Ana Lúcia, de Tantas Gentes e de Jesus, O Emanuel.
Joselito da Nair!!
ResponderExcluirConfirmada a sua participação no Programa Blitz Total da Rádio Jacobina FM, desta quinta, 27, a partir de 13h00, abordando sobre Sexo e Sexualidade.
Grande abraço,
Geyder
Talvez exista dialética mesmo na falta de democracia, pois a dialética preconiza o contraditória, ora, se entendemos as amarras podemos visualizar o seu oposto, ai a dialeticidade, dai a possibilidade de uma práxis pedagógica, nas palavras de Vasquez, transformadora por ser práxis e não mero união de teoria e prática.
ResponderExcluirParabéns pelas reflexões. Sua escrita é envolvente.