sábado, 18 de setembro de 2010

Ei, Ei, Ei, Você é um Democrata Cristão?

Eymael, um senhor branco, de sorriso elegante, candidato a presidente, declara-se um democrata cristão, repetido no jingle “Ei, Ei Eymael! Um democrata cristão...” Um adjetivo substantivado (democrata), precedido pelo artigo “um”, seguido pelo adjetivo “cristão”. Como estou de recesso em meu trabalho das mil coisas do mundo profissional, tive tempo de maquinar, em minha “oficina do diabo” umas idéias velhas sobre tal peça de propaganda política do candidato acima apontado. Esta peça, no contexto eleitoral, ganha contornos bem precisos, visto ser a busca do voto o objetivo puro e simples desse momento que aponta o caminho do poder e seus desdobramentos, benéficos e maléficos.

Ser democrata, como o DEM supõe na nova denominação do antigo PFL, aparentemente representa uma mudança de rumos, o que é algo desejável. Quando ouço falar que alguma pessoa é uma democrata, imediatamente me vem a idéia de uma pessoa comprometida com os princípios e valores da democracia. Alguém que sabe e acredita que o poder emana do povo e que, em linhas gerais, o eleito é o escolhido através do voto e de outros mecanismos de participação popular para servir a este povo, que acreditou em suas propostas de serviço à população. E servir ao povo não é agradar ao povo, caindo no populismo, mas governar, legislar e julgar com retidão e decência, aplicando e acompanhando um programa de governo que seja benéfico à população, seguido de um processo avaliativo sistemático que vá fornecendo dados importantes de correção dos rumos das políticas públicas implementadas.

Supõe-se que um democrata respeite a diversidade e trabalhe com a mesma, suscitando o respeito ao outro, independente de sua condição social, econômica, cultural, política e de sua opção religiosa, sexual, entre outras, como reza a Constituição Federal. Nesse caso, não cabe adjetivos ao democrata, seja cristão, seja ateu, seja budista, seja à toa. Mas Eymael além de denominar-se “democrata”, anexa o adjetivo “cristão”, demonstrando claramente sua opção religiosa, num dos países, em ano eleitoral, que, teoricamente, tem o maior número de cristãos. Tudo de bom: democrata e cristão ao mesmo tempo. O primeiro termo atende ao apelo político e, o segundo, atende ao apelo eleitoral, afinal, entre votar num cristão e num não-cristão o que seria melhor nesse país, nesse contexto e nesse tempo? Mesmo assim admito, não dá para saber o que prevalece: a lógica eleitoral ou a lógica dos valores e princípios democratas e cristãos? Só Eymael pode responder, mas, de qualquer forma, como Cristo mesmo avisa, todo tempo tem os seus sinais, e todo ser humano deixa rastros de si mesmo, desde a maneira que come até o modo como dorme, é só observar.

Associar aos princípios democráticos os valores cristãos pode render a boa nova que se deseja para o mundo. Cristo inverte a lógica do poder: “Quem quiser ser o maior dentre vós, que seja o menor.” Ao aceitar, na condição de homem-Deus, a humilhação na cruz, morrendo ao lado de ladrões, ensina que a glória do poder, que leva a uma verdadeira ressurreição, é o serviço para que o outro seja mais, liberto, emancipado de tudo o que o aflige e o diminui em sua humanidade. Perfeito. No filme “Nosso Lar”, o governador se curva perante o indivíduo que vai lhe pedir orientação, refletindo essa proposta política, do poder a serviço do outro e não de si mesmo.

Entretanto, do ponto de vista histórico, o ser cristão do indivíduo é atravessado pela cultura política colonialista e escravocrata que o desvia do seu propósito, na mistura de valores cristãos e democratas e desvalores individualistas mesquinhos do homem baiano e brasileiro. Nessa cultura o poder é uma máquina de atropelo, de temores, de favores e de corrupções. A denominação nada diz de quem se auto denomina. Autodenominar-se democrata não significa estar a serviço da democracia. Aliás, Arruda, entre tantos outros supostos democratas, colocam o serviço público para atender aos seus interesses particulares de enriquecimento ilícito. Da mesma forma, autodenominar-se “cristão”, não significa seguir, ou pelo menos tentar, em nome desse mesmo Cristo, uma mudança de rumo em sua vida. Há cristãos e há “sa-cristões”. Estes últimos mudam suas opiniões e posicionamentos por uns tostões, de acordo com as situações. Nesse caso, o cristão pode contradizer o democrata, impedindo ou limitando os não-cristãos de participarem ativamente do processo de decisões, conforme os valores da democracia. Do mesmo modo, o falso democrata pode impedir ou limitar o cristão de basear o seu comportamento político a serviço de todos, principalmente dos que mais precisam, conforme os valores cristãos.

Portanto, ser um democrata cristão no período eleitoral de um país cristão não quer dizer nada sobre o que apontaria tais denominações. Pode até ser que o falso democrata acabe com o cristão ou que o falso cristão acabe com o democrata, ou pior: que ambos se unam para atender aos desejos mesquinhos de poder e riqueza em detrimento daqueles a quem deveriam servir.


Joselito da Nair, do Zé, do Rafael, de Ana Lúcia, de Tantas Gentes e de Jesus, O Emanuel.

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