Sou a favor das mudanças a respeito
da formação dos médicos e médicas – que não são doutores, pois doutor é quem
fez doutorado. As médicas e os médicos não faziam passeatas contra a falta de
infraestrutura no sistema de saúde brasileiro, afinal elas e eles não sentem na
pele o que os demais mortais brasileiros sentem. Agora, quando o governo mexe
com a “reserva de mercado de trabalho” delas e deles fazem mobilizações e
passeatas reclamando. Ora, qual a ideia que está por trás da maioria dos
estudantes de medicina? Fazer medicina para contribuir com a melhoria do
sistema de saúde brasileiro? Desenvolver um trabalho preventivo e curativo nos
municípios interioranos do Nordeste brasileiro e em suas zonas rurais? Ou será
que são dominados pelas ideias antigas e liberais de enriquecer e ganhar status, quem sabe até tornando-se
prefeito de uma “cidadezinha” dessas?
O pensamento individualista
liberal, associado ao patrimonialismo doentio que herdamos de Portugal, atravessa todo o nosso corpo social, produzindo aberrações que são
silenciadas por práticas discursivas hipócritas. Queremos é ganhar dinheiro!
Dinheiro, dinheiro, dinheiro! A busca da maximização do lucro produz médicos
sem alma, advogados sem caráter, policiais corruptos e assassinos, professores
sem compromisso, empresários que prestam serviços públicos de péssima qualidade
na área de transportes, energia elétrica, saúde e infraestrutura. Não é a toa a
explosão de manifestações nas ruas brasileiras. O povo brasileiro cansou de
tudo isso. Cansaram de ser atendidos por médicos mau humorados que, muitas
vezes, utilizam o diagnóstico da moda: virose, para muitos casos que lhes
chegam e que a má vontade em atender o povo fica explícita em seus modus operandi. Tem muita gente morrendo de... virose.
O estado e os sucessivos
governos, claro, devem ser os primeiros responsabilizados por tudo isso, pois é
papel primordial do governo atender à população do seu território com serviços
públicos eficazes e eficientes, com qualidade técnica, política e humana.
Entretanto, é preciso não desconhecer que, quando um indivíduo põe a farda de
policial ele também é o estado! Uma médica, um médico, quando entram no serviço
público e estão em seus plantões, são o estado! Um professor que atua nas
escolas públicas municipais, estaduais e nas universidades públicas é o estado!
Se as condições de trabalho oferecidas, os equipamentos estão defasados e
quebrados, os instrumentos e remédios estão em falta, as UTI’s estão lotadas,
denunciem ao Ministério Público! Façam mobilizações passeatas, comuniquem à
sociedade para que as responsabilidades sejam apuradas, os responsáveis punidos
e os problemas sanados! Por favor!
Agora, o que os médicos e as
médicas brasileiros (as) querem? “Que tudo continue como dantes no quartel de Abrantes?”
Querem manter seus privilégios sem sair do seu comodismo? Querem continuar em
seus consultórios assépticos de “povo”, todos nas capitais, cobrando R$ 300,00
a consulta? Querem continuar com seus jalecos brancos pelas ruas sobressaindo-se
dos demais profissionais do serviço público e ganhando 20 mil reais mensais por
plantões semanais de má vontade? Outra coisa, a questão racial perpassa a formação de
médicos. Os negros, homens e mulheres, são minoria nesta profissão, geralmente
formada por brancos das classes médias altas das capitais. É preciso que haja
uma política pública, qualquer que seja, para aumentar o número de médicos e
médicas de pele negra, pois aqui o racismo é de derme, mas a hipocrisia é de
epiderme. Cotas para médicos já!
A questão de o médico ser
bom ou ruim em nossas paragens, não é questão de formação, mas de deformação.
Deformação pelo preconceito, pela busca de privilégios, pelo enriquecimento sem
prestação de serviços públicos de qualidade que a população atendida sinta no
cotidiano. Deformação pelo modo como um médico é tratado no Brasil: “doutor”,
sintoma de um processo histórico colonial em que trabalho, trabalho de verdade,
o que, segundo Marx é o que, de fato, produz riqueza, foi associado à
escravidão, a quem era escravo, considerado inferior. Depois foi adquirindo
outros sentidos, chegando até os dias de hoje à associação de que quem não
estudou tem mais é que trabalhar mesmo. Isto é um paradoxo! Não há como um pais
desse produzir riqueza. Aliás a crise econômica que assusta o Governo Dilma é
justamente esta: temos aumentado a renda (via empréstimos) e o consumo (via
crédito fácil) sem aumento de produtividade, o que, inevitavelmente, produz
inflação.
O que não pode é aumentar a
incidência de médicos na capital, concentrando ainda mais a formação nas
grandes metrópoles, como é o caso da Universidade do Estado da Bahia, UNEB que,
embora seja a universidade mais interiorizada da Bahia terminou criando,
recentemente, um curso de medicina em Salvador. Claro, já sei a alegação: a
maioria dos professores e das professoras de medicina não iria ganhar o mesmo que os demais
professores e professoras da UNEB ganham para ensinar no interior da Bahia.
Sejam bem vindos os médicos
que querem trabalhar no interior! Sejam eles e elas estrangeiros, sejam daqui
mesmo. Sejam bem vindos os que querem, de fato, prestarem um serviço público de
qualidade, atendendo aos pacientes com paciência, com dedicação, com espírito
investigativo, sem diagnósticos precoces fugindo, com pressa, dos problemas de
saúde dos outros como se não tivesse nada a ver com isso. Sejam bem vindos os
que querem desenvolver um processo de pesquisa sobre as enfermidades endêmicas e
epidêmicas que afligem a população da localidade onde o (a) mesmo (a) desenvolve
seu trabalho na área de saúde, tanto preventivo, quanto curativo.
Joselito da Nair, do Zé, do
Rafael, de Ana Lúcia, de Tantas Gentes e de Jesus, O Emanuel
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